A gravidez é um momento repleto de expectativas e transformações, mas, para muitas mulheres, pode ser também uma fase de desafios emocionais intensos. Embora a maior parte das gestantes passe por exames de sangue, glicemia, pressão e urina durante o pré-natal, a saúde emocional muitas vezes fica de lado. De acordo com a psicóloga perinatal Rafaela Schiavo, transtornos emocionais como ansiedade, estresse e depressão são mais comuns do que infecção urinária ou diabetes gestacional, mas infelizmente não costumam fazer parte da avaliação rotineira durante o acompanhamento da gestação.
Os desafios emocionais durante a gravidez
Para Rafaela Schiavo, a gravidez representa o período mais crítico entre as três fases da vida feminina que demandam atenção emocional: adolescência, climatério (período próximo à menopausa) e o ciclo perinatal (que inclui a gestação e o pós-parto). Apesar disso, é justamente na gestação que a saúde emocional é menos monitorada. A psicóloga destaca que a fase gestacional costuma ser romanticamente idealizada, o que dificulta a percepção de sinais de sofrimento psicológico e favorece o desenvolvimento de transtornos como a depressão. “Infelizmente, o cuidado emocional da gestante acaba sendo negligenciado, embora seja um período de grandes transformações”, afirma.
Em muitos casos, os quadros de depressão pós-parto começam a se manifestar ainda na gestação, mas, por não serem identificados, se prolongam e se intensificam após o nascimento do bebê. “Nos últimos 10 a 15 anos, a maioria dos estudos aponta que a depressão pós-parto inicia ainda na gestação. Quando não é identificada, ela persiste ao longo dos meses e se agrava após o parto”, explica Rafaela Schiavo.
Quando a ansiedade e o estresse não são normais
É importante, segundo a especialista, saber diferenciar os sintomas típicos da gestação dos que indicam a necessidade de um acompanhamento psicológico. A ansiedade e o estresse são comuns durante a gravidez, mas quando esses sentimentos se tornam excessivos e constantes, podem afetar tanto o bem-estar da mulher quanto o desenvolvimento do bebê. Fatores como gestações não planejadas, falta de rede de apoio e o medo do parto podem contribuir significativamente para o aumento desses sintomas.
“A ansiedade ou o estresse em níveis elevados não são esperados, e esses quadros precisam ser tratados. O impacto não é apenas para a gestante, mas também pode prejudicar o desenvolvimento emocional e físico do bebê”, alerta Rafaela. Ela explica que é fundamental que gestantes recebam apoio psicológico quando necessário, a fim de evitar que esses sentimentos se tornem prejudiciais à saúde.
A importância da triagem emocional no pré-natal
Rafaela defende que a triagem emocional durante o pré-natal seja uma prática simples e acessível. A psicóloga sugere a utilização de ferramentas rápidas de rastreio que poderiam ser aplicadas pelos profissionais de saúde, como enfermeiros e obstetras, em menos de 4 minutos. “Com um tempo tão curto, é possível avaliar se há sinais de alterações emocionais na gestante, permitindo que ela seja encaminhada para um especialista ainda durante a gravidez, e não só depois, quando o quadro já se agravou”, afirma Rafaela.

Prevenção e acolhimento: o papel do pré-natal psicológico
O pré-natal psicológico é uma abordagem complementar que visa prevenir, acolher e fortalecer emocionalmente a mulher. Para Rafaela Schiavo, essa abordagem não só previne o agravamento de quadros de ansiedade e depressão, como também prepara a gestante para o parto e a maternidade de forma mais equilibrada emocionalmente. “Com o acompanhamento adequado, conseguimos evitar que o quadro evolua para algo mais grave, garantindo uma gestação mais saudável em todos os aspectos”, comenta.
Onde procurar ajuda durante a gravidez?
Embora a legislação brasileira tenha avançado ao garantir o direito ao acompanhamento psicológico durante a gestação, o parto e o pós-parto, ainda há desafios no acesso a profissionais especializados. Rafaela destaca que, no Brasil, menos de 1% dos psicólogos têm formação específica em psicologia perinatal, o que dificulta o atendimento adequado para as gestantes. “É fundamental que as mulheres busquem apoio emocional quando necessário, para que a saúde mental seja tratada com a mesma importância que a saúde física”, alerta.
A psicóloga ainda ressalta a Lei 14.721/2023, que assegura o direito ao acompanhamento psicológico tanto no SUS quanto na rede privada. A orientação é procurar a unidade de saúde onde a gestante realiza o pré-natal e questionar sobre a disponibilidade do serviço psicológico.
Quando buscar ajuda psicológica durante a gestação?
Não é preciso esperar que os sintomas se agravem para buscar ajuda. Rafaela Schiavo alerta que, sempre que a mulher sentir sintomas emocionais intensos, ela deve procurar apoio. Entre os sinais que indicam a necessidade de acompanhamento psicológico estão:
- Ansiedade excessiva ou medo persistente
- Tristeza profunda ou sensação de apatia
- Irritabilidade constante sem motivo claro
- Dificuldade de se conectar com a gestação ou o bebê
- Insônia frequente ou sensação de exaustão mental
- Falta de apoio ou sentimento de solidão
“O acompanhamento adequado, realizado no momento certo, pode evitar que esses sintomas evoluam para algo mais sério, proporcionando à mulher mais segurança emocional para viver a gestação com saúde e bem-estar”, conclui a psicóloga.