O estudo, conduzido ao longo de mais de duas décadas, teve início em 1999 no Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Liderada pela pesquisadora e professora doutora Tatiana Coelho de Sampaio, a equipe investigava formas de estimular a regeneração da medula espinhal, um desafio que, até hoje, não tinha solução prática efetiva.
O foco da pesquisa recaiu sobre a laminina, uma proteína presente naturalmente no corpo humano, responsável por auxiliar a comunicação entre neurônios durante o desenvolvimento embrionário. A equipe descobriu que seria possível recriar essa malha de proteínas em laboratório, a partir de placentas humanas, resultando em um composto chamado polilaminina.
Como funciona a polilaminina no corpo
De acordo com os pesquisadores, a polilaminina, ao ser aplicada na região da lesão, pode estimular a regeneração da conexão entre neurônios. Isso permite o restabelecimento do impulso elétrico necessário para a movimentação, mesmo após uma lesão considerada severa.
Polilaminina foi desenvolvida por 25 anos por pesquisadora da UFRJ. Na fase experimental do antídoto, pacientes recuperaram movimentos; Anvisa diz que aguarda dados complementares.
— Folha de S.Paulo (@folha) September 9, 2025
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“O que a gente descobriu aqui foi uma maneira de fazer com que essa conexão se restabeleça”, explicou a bióloga Tatiana Sampaio.
Essa descoberta foi testada em um grupo pequeno de pacientes e cães, todos com histórico de lesão medular grave. O tratamento consistiu em uma única aplicação da substância diretamente na área lesionada, realizada até 72 horas após o trauma.
Histórias reais de recuperação
O bancário Bruno Drummond de Freitas é um dos primeiros beneficiados pelo tratamento experimental. Após sofrer um acidente de carro em 2018, ele teve parte da medula esmagada e perdeu os movimentos do corpo.
“Acordei pós-cirurgia sem lembrar de nada e sem fazer movimento… Dedos da mão, pés, perna, quadril, abdômen, nada mexia”, relatou Bruno.
Autorizado pela família, Bruno se tornou paciente do estudo acadêmico. Duas semanas após a aplicação da polilaminina, ele conseguiu mexer o dedão do pé, um pequeno gesto que se revelou um marco importante para a pesquisa.
Hoje, Bruno celebra a recuperação significativa: “Consigo levantar, andar, dançar, voar… Isso me garantiu minha independência”, comemorou.
Outros pacientes também tiveram avanços notáveis. A artesã Nilma Palmeira de Melo recuperou controle do tronco e hoje comanda a cadeira de rodas com autonomia: “Ficar em pé, porque o médico falou que eu não ficaria. Eu só faltava dançar de felicidade”, disse.

Avanços também com animais
Em 2021, uma farmacêutica brasileira testou o composto em cães com lesões medulares antigas. Dos seis animais tratados, quatro voltaram a se movimentar. Os resultados foram publicados em uma revista científica internacional, fortalecendo a base de evidências da eficácia da polilaminina.
Novos testes clínicos dependem da Anvisa
Apesar dos avanços, a próxima etapa do estudo, que incluirá mais pacientes em ambiente clínico regulamentado, ainda precisa da autorização da Anvisa. A agência aguarda dados complementares que comprovem a segurança do tratamento.
“Como foram testes acadêmicos, o que a empresa está fazendo são testes complementares para atender os requisitos regulatórios”, explicou Claudiosvan Martins, da Anvisa.
O neurocirurgião Marco Aurélio Brás de Lima, que acompanhou o estudo, destacou a inovação: “Nenhum estudo no mundo, até hoje, havia demonstrado uma medicação capaz de atuar diretamente na regeneração medular com esse resultado.”