“Errando que se aprende”, diz o velho ditado popular. Está certo que todas essas antigas sabedorias têm algum fundamento e viraram tradição porque fazem sentido. Mas, na prática, nenhum pai ou mãe quer ver o seu filho errando, ficando chateado, ou se arrependendo.
Nessa ânsia de não deixar as crianças cometerem seus próprios deslizes, acabamos por fazer com que elas vivam em uma redoma de vidro, protegidas de todos os enganos. Afinal, se os pais estão sempre ali para decidirem por elas, que tipo de esforço será necessário para analisar, entender e agir? Quase nenhum!
Está aí um dos maiores motivos para dizermos: Deixe o seu filho errar. Assim, sem medo de ser feliz e sem medo de que ele arrisque e se machuque. O bom senso, claro, faz parte do processo. Você não vai deixá-lo sozinho e desamparado nas decisões da vida, mas também não vale tomá-las pela criança.
O caminho do meio está aí justamente para isso. O papel dos pais é, desde muito cedo, apoiar e orientar, para que a criança possa desenvolver seu senso crítico e seja capaz de tomar suas próprias decisões, estando elas certas ou não. Isso vai torná-la mais independente e também irá prepará-la para o futuro.
Lá na frente
Quando a criança é estimulada a explorar o mundo ao seu redor de maneira mais independente, ela cresce de forma diferente daquela criança que não pôde tomar decisões sozinha e aprender com as consequências dos seus atos.
“Com o apoio dos pais essa criança se torna um adulto mais consciente, com maior responsabilidade e maior habilidade para lidar com adversidades e para tomar de decisões”, explica Mariana Bonsaver, psicóloga da Pro Matre Paulista, filha de Tullio e Isabel.
Tudo o que fazemos na infância dos nossos filhos afeta o futuro deles. Uma criança que explora possibilidades, testa e tem a chance de aprender com seus erros está muito mais propensa a se tornar um adulto que sabe lidar com problemas.
Mas nem precisa ir tão longe assim para entender a importância de apoiar os filhos a tomarem suas próprias decisões. Em muitos momentos, a criança estará sozinha, como na escola ou na casa dos amigos, e precisará encarar as mais variadas situações. É aí que ela precisa se sentir segura e preparada para poder tomar decisões sem medo de errar ou depender de outras pessoas.
Começa quando?
Normalmente, a primeira dúvida que surge na cabeça dos pais é: quando eu posso deixar meu filho começar a tomar decisões? E a resposta é mais simples do que parece. Não precisa começar com decisões complexas e importantes. Mas escolhas simples do dia a dia são o início perfeito, ainda mais para crianças pequenas.
“A idade ideal varia conforme a escolha. Por exemplo, a partir dos 4 anos os pais podem apresentar duas opções de trocas de roupas e permitir que a criança escolha a que mais gostar. A partir dos 8 anos, ela já pode escolher entre muitas opções direto do armário. Depois dos 10 anos, ela pode fazer várias escolhas, como o esporte que deseja praticar, a língua que deseja estudar, um lugar que gostaria de visitar, mesmo que a decisão final seja dos pais”, afirma Viviane Helena Ferreira Rossi, mãe de Luis Felipe e João Pedro, psicóloga clínica infantil e adolescente.
Vale lembrar que cada criança se desenvolve de um jeito, então você deve proporcionar as escolhas para o seu filho conforme ele apresentar a maturidade necessária para aquilo. No começo, o importante é apresentar um número limitado de opções, para que a criança não fique confusa com tantas possibilidades. Começar aos poucos e com decisões simples é o ideal.
Mas se você reparou que seu filho já consegue, por exemplo, escolher entre duas opções de roupa com tranquilidade, aumente o desafio. Coloque mais opções ou então até mesmo faça com que ele escolha entre as peças do armário. Colocar novas propostas e gerar dúvidas também faz parte do desenvolvimento.
O famoso limite
Certo, até aqui você já entendeu a importância de deixar que a criança faça suas próprias escolhas e, a partir delas, possa errar, aprender e tentar novamente. Então você também deve estar se perguntando onde entra o limite entre deixar errar e proteger e como alcançar esse caminho do meio.
“Muito difícil, o foco principal dos pais é a segurança do filho. Logo, há sempre o receio de que ele se machuque, em todos os sentidos. Uma boa comunicação pode proporcionar um equilíbrio”, diz Deborah Moss, mãe de Ariel, Patrick e Alicia, neuropsicóloga e mestre em Psicologia do Desenvolvimento pela USP.
Os pais devem olhar para a criança como uma pessoa capaz de fazer determinadas escolhas sozinha e confiar! Não é fácil, mas esse processo só faz bem ao desenvolvimento durante a infância. Além disso, para quem encontrar mais dificuldades, seguir o exemplo da escola é uma boa dica.
Nas escolas é comum que as crianças ganhem mais liberdade de escolha e independência. Então procure estar antenado no que o seu filho pode decidir enquanto está nesse espaço, e reproduzir isso em casa pode ser uma boa. Mas não se acomode! Lembre sempre de dificultar e propor novos desafios.
“Nunca conseguiremos proteger nossos filhos de tudo, então, a cada escolha que eles fazem, a proximidade e confiança que construímos durante todo o processo facilita a nossa credibilidade e comunicação com eles”, afirma Regiane Silva, mãe de Rafaela e Luana, coach master em programação neurolinguística, hipnose e neurossemântica.
Dessa forma podemos identificar o limite entre a liberdade e a proteção mais facilmente. Então lembre-se que o segredo é uma boa comunicação, aliada de confiança, fundamental para qualquer relação funcionar, até mesmo entre pais e filhos!
Dá para atrapalhar?
Sim, é possível entrar no caminho do desenvolvimento do seu filho de forma que ele não seja ajudado, mas que você acabe atrapalhando o processo. Mas não esquente a cabeça! Basta ter em mente que o fundamental é o diálogo, sempre.
“Proteger em todas as situações sem explicações pode ser um erro, em que os pais não mostram por que está ocorrendo aquilo, mas já agem evitando alguma coisa ruim”, explica Yuri Busin, filho de Walnei e Tales, psicólogo.
Ou seja, quando você impede que o seu filho tome decisões porque, de fato, você sabe o que é melhor para ele e também não explica o motivo da sua escolha, ele não tem a oportunidade de experimentar. Assim, a criança acaba sendo privada de ter uma maior autonomia e vai sempre depender dos pais para qualquer coisa que desejar fazer.
Lidar com o erro
Se por um lado é importante orientar, deixar que a criança escolha e aceitar que ela pode errar, por outro é fundamental saber como lidar com esse erro. Vamos então aos fatos: você vai orientar, vai cuidar, vai falar e vai fazer de tudo para que o seu filho entenda a melhor opção, mas ele vai escolher e fazer o oposto. Normal!
Não significa que o seu filho seja um rebelde ou que ele queira te desrespeitar, mas que aquela decisão fez sentido para ele e, em uma próxima oportunidade, ele vai ponderar melhor. Porém, depois de tantos avisos e recomendações, é normal que os pais fiquem bravos e irritados com o erro.
É justamente aí que os pais erram junto com os filhos. “O que gera frustração na criança são atitudes exageradas dos pais, como, por exemplo, apagar as respostas do filho na lição de casa para que ele refaça toda a atividade”, esclarecem Roberta e Taís Bento, mãe e filha, sócias no projeto Socorro, Meu Filho Não Estuda e nossas embaixadoras.
Em vez de surtar e apontar o erro da criança, respire e procure manter a calma. Por exemplo, no caso da lição de casa errada, Roberta e Taís recomendam que os pais ajudem a encontrar ou identificar o erro, mas a criança é quem deve apagar as suas próprias respostas.
O importante é não se estressar com o erro das crianças. Quando elas exploram, experimentam e descobrem, muitos processos novos e distintos passam por seus cérebros. Todos esses estímulos, em conjunto, são formadores de novas memórias no cérebro, que, no futuro, serão usadas para novos aprendizados. Então deixa errar, sim!
*Por Carolina Piscina, filha de Ana Maria e Osvaldo
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