Não é segredo: o acompanhamento regular com o pediatra é de praxe desde o nascimento e durante toda a infância. Mas quando o assunto é a consulta no cardiologista, geralmente associamos a imagem a adultos e idosos sem considerar que, muitas vezes, as crianças também precisam visitar o consultório.
A saúde do coração pode precisar de atenção e cuidados desde cedo. Primeiro, temos que considerar que há dois tipos de problemas cardíacos: as cardiopatias congênitas, ou seja, que estão presentes desde o nascimento ou até antes dele, e as cardiopatias adquiridas. No primeiro caso, as enfermidades surgem durante o desenvolvimento fetal. Segundo Grace Bichara, mãe de Felipe, cardiologista pediátrica, a maioria dos problemas cardíacos infantis faz parte desta categoria.
Existem também as formas adquiridas, como as miocardites (inflamação do miocárdio), que podem ser causadas por vírus, febre reumática (uma doença inflamatória causada por uma bactéria que pode atingir o coração) e alterações das artérias coronárias (vasos responsáveis pela chegada de oxigênio e outros nutrientes ao músculo cardíaco). De acordo com a médica, até alguns medicamentos e doenças maternas podem levar também ao aparecimento de cardiopatia no bebê.
Antes de nascer
Carlos Regenga Ferreiro, pai de Thiago, Marcella e Roberta, pediatra cardiovascular, explica que o diagnóstico de algumas cardiopatias pode ser feito antes do nascimento, com o exame de ecocardiograma fetal, um tipo de ultrassom. Isso dá a possibilidade de identificar precocemente a presença de malformação no coração.
A vantagem de se obter um diagnóstico intrauterino é saber qual a gravidade do problema, planejar o tratamento no pós-parto e até o tipo de parto e a equipe que deverá estar presente, caso seja necessária uma intervenção cirúrgica logo após o nascimento, por exemplo. Entretanto, de acordo com o médico, apenas 10% dos diagnósticos aqui no Brasil são feitos ainda no útero da mãe.
Sopro no coração
Uma das alterações mais comuns é o sopro no coração, que se caracteriza por um ruído produzido quando o sangue passa pelas estruturas do órgão. Segundo a Sociedade Brasileira de Cardiologia, cerca de 80% das crianças têm algum tipo de sopro ao longo da infância. “Nem todo sopro é uma cardiopatia congênita. Alguns são fisiológicos e desaparecem com o tempo, sem precisar de tratamento”, explica o pediatra.
No entanto, a investigação médica é necessária e, para tirar a dúvida, um ecocardiograma deve ser realizado. O sopro pode ser ouvido (ou auscultado, no termo técnico) durante um exame com o pediatra. Não existe uma causa definida para o aparecimento do sopro fisiológico, mas as crianças com esta condição têm o coração normal e não têm qualquer restrição. Já a condição patológica pode ser congênita ou adquirida e deve ser investigada pelo médico para que ele indique o tratamento mais adequado.
Vale a visita
Se em algum momento o pediatra ouvir um sopro ou suspeitar de uma cardiopatia, a criança deve ser encaminhada ao especialista. Além disso, segundo a cardiologista pediátrica, se há histórico familiar de cardiopatia congênita, é preciso ficar atento. Em alguns casos, a visita é necessária também para liberar a prática de atividades físicas, como antes de matricular o filho em uma escolinha de futebol.
Este foi o caso da Relações Públicas Raquel Gasparelli, mãe de Gabriel. O filho nasceu com sopro fisiológico, mas isso não foi um problema. Quando ele tinha cinco anos, a mãe resolveu levá-lo para consultas de rotina. Hoje, com sete anos, ele vai anualmente. “Como ele pratica futebol, precisava de atestado comprovando que estava tudo bem com a saúde. Já fez dois eletrocardiogramas. Ele corre muito, tem um superfôlego”, conta Raquel. O garoto ainda possui o sopro, mas convive normalmente com isso. Sem nenhuma restrição.
A visita ao cardiologista não precisa ficar restrita a estes casos. “A época pré-escolar, entre quatro e cinco anos de idade, é o momento ideal para a primeira visita das crianças que não apresentam cardiopatia congênita”, diz o pediatra cardiovascular. Esta medida preventiva é importante, pois, segundo o especialista, é uma etapa de pleno desenvolvimento da criança.
E quando é congênito?
O filho mais velho de Leticia Regazoli Dessunti, supervisora de Recursos Humanos, mãe de Felipe e Henrique, teve que passar por uma operação devido a um problema congênito chamado Comunicação Interatrial (CIA), um buraquinho entre os átrios esquerdo e direito do coração. Este defeito ocasiona um fluxo anormal de sangue do lado direito para o lado esquerdo. Felipe começou a apresentar sintomas como baixo ganho de peso e sudorese noturna, mas o sopro característico desta enfermidade não foi notado pelos médicos.
Por ter alergia à proteína do leite de vaca e, com isso, algumas restrições alimentares, a princípio, ela não achou que o peso do filho pudesse estar associado a uma patologia. Porém, o menino tinha dois anos e cinco meses quando as preocupações da mãe aumentaram. Em uma visita à pediatra, foram solicitados diversos exames, incluindo uma radiografia, que detectou que a caixa cardíaca estava aumentada. Ou seja, o coração estava maior do que o normal.
Com a investigação, descobriram que, ao dormir, o coração dele se sobrecarregava para funcionar, pois recebia muito sangue. O esforço era tão grande que ele transpirava muito e consequentemente não ganhava peso. Com a cardiopediatra, fizeram o ecocardiograma, viram que o “buraco” tinha 16 milímetros e era muito grande para o tamanho do coração. Apenas uma cirurgia poderia fazer a correção. Em 2 meses após terem descoberto o problema Felipe operou e hoje está muito bem. As idas ao cardiologista continuam sendo necessárias, a cada 6 meses, apenas para acompanhamento.
Sinais de alerta que indicam necessidade de consulta na infância
- Respiração rápida e ofegante
- Cansaço quando a criança faz algum esforço
- Palpitação
- Dor no peito
- Baixo ganho de peso
- Sudorese excessiva
- Resfriados ou infecções na garganta de repetição e broncopneumonia