Ter um filho é uma jornada maravilhosa, mas também pode ser uma verdadeira maratona diária. Além de cuidar dos filhos, muitos pais se veem responsáveis por toda a logística da casa, dos compromissos da família e, muitas vezes, até do cuidado com os próprios pais. De acordo com a pesquisa 2025 Cost of Care Report, realizada nos Estados Unidos com 3.000 pais, a sobrecarga parental atingiu níveis alarmantes. O levantamento mostrou que 90% dos pais relataram perda de sono devido às responsabilidades de cuidado, enquanto 80% disseram já ter chorado por exaustão.
A parentalidade intensiva e a pressão sobre os pais
A parentalidade intensiva é um estilo de criação em que os pais estão sempre por perto, participando de tudo e garantindo que os filhos tenham a melhor experiência possível em cada fase da vida. O conceito foi introduzido pela socióloga Sharon Hays em 1996, sob o termo “maternidade intensiva”. Parece ideal, mas quando levada ao extremo, essa abordagem pode gerar mais estresse do que benefícios. O pior é que isso afeta tanto os pais quanto as crianças.
Muitos pais sentem que precisam estar presentes em cada atividade, resolver todos os problemas e garantir que seus filhos tenham uma infância perfeita. Essa necessidade pode ser influenciada por diversos fatores, como o impacto das redes sociais, que criam a ilusão de pais perfeitos e aumentam a pressão para estarem sempre no controle. Além disso, as expectativas sociais de que os pais devem ser 100% presentes e emocionalmente regulados o tempo todo podem ser exaustivas.
Experiências passadas também influenciam, pois alguns pais tentam evitar que os filhos enfrentem dificuldades que eles mesmos viveram na infância, assumindo um papel superprotetor. Por fim, a personalidade também conta: pais perfeccionistas ou altamente focados em resultados tendem a transferir esse traço para a educação dos filhos, criando um ambiente de cobrança constante.
De acordo com a psicóloga e psicanalista Ana Carolina Elston, mãe de Benjamín e Marina, especialista em infância, adolescência e orientação de pais, a busca pela perfeição na parentalidade pode trazer intenso sofrimento psíquico. “A imagem romantizada de pais e mães perfeitos recai como um peso enorme sobre aqueles que se sentem comparados, envergonhados e solitários em suas experiências com os filhos”, explica a especialista.
Quando o cansaço fala mais alto
O desgaste não é apenas físico. Segundo a pesquisa 2025 Cost of Care Report, a carga emocional de tentar dar conta de tudo faz com que 75% dos pais sintam uma sensação constante de angústia e 71% apresentem problemas de saúde decorrentes do estresse. Além disso, 73% relataram tensão no relacionamento ou casamento e 67% disseram sentir culpa por precisar delegar parte dos cuidados a terceiros, como creches ou cuidadores. A pesquisa também revelou que 48% dos pais não têm suporte suficiente para lidar com todas as demandas diárias.
Segundo Ana Carolina, a falta de uma rede de apoio é um dos fatores que agravam esse cenário. “A sobrecarga parental também existe nesse viés da falta de suporte, não apenas pelo esgarçamento dos vínculos familiares na modernidade, mas também pela diminuição da ideia de coletivo nas grandes metrópoles, onde ninguém conhece seus vizinhos e os pais não contam com nenhuma ajuda imediata além dos cônjuges.”

O impacto na vida social e profissional
Além da exaustão física e emocional, muitos pais acabam abrindo mão de momentos importantes de lazer e até mesmo de oportunidades profissionais. A mesma pesquisa aponta que, em média, pais e mães perdem 34 compromissos importantes ao longo do ano devido à dificuldade de conciliar a rotina com os cuidados da família. Entre esses eventos perdidos estão encontros com amigos (52%), hobbies e atividades prazerosas (46%), viagens (37%) e até mesmo eventos familiares significativos, como aniversários e casamentos.
No âmbito profissional, 15% dos pais relataram ter reduzido sua carga horária para conseguir dar conta das responsabilidades familiares, enquanto 7% precisaram sair do mercado de trabalho completamente. Outro dado preocupante é que 20% dos entrevistados afirmaram ter se endividado para custear os cuidados com os filhos e familiares dependentes.
Os impactos da parentalidade intensiva nas crianças
O engajamento dos pais é essencial, mas quando se torna excessivo, pode trazer efeitos colaterais preocupantes. Pais sobrecarregados tendem a esquecer-se de si mesmos, o que pode resultar em estresse e exaustão. Quando tudo gira em torno das crianças, elas podem sentir uma pressão excessiva para corresponder às expectativas muito altas. Além disso, se os pais estão sempre resolvendo todos os problemas, as crianças podem ter dificuldades em aprender a lidar com desafios e tomar decisões sozinhas. Esse ambiente pode gerar ansiedade e frustração tanto nos pais quanto nos filhos, criando um ciclo de insatisfação.
Para a psicóloga e psicanalista, o excesso de proteção pode impedir que as crianças desenvolvam habilidades importantes. Além disso, Ana Carolina destaca que o conceito de “pais suficientemente bons”, do psicanalista, pediatra e autor Donald Winnicott, pode ajudar a aliviar a pressão da parentalidade: “O autor nos demonstra que os erros parentais, a falta e a falha dos pais também ajudam na construção subjetiva saudável. Ser uma mãe ou um pai “suficientemente bons” não significa ser perfeito, mas sim ser ativo na escuta das necessidades dos filhos e buscar acertar naquilo que é essencial: principalmente na comunicação e na conexão. O importante não é acertar em si, mas tratar de corrigir os erros quando forem identificados. Ali onde os pais não puderem acertar, se abrirá a possibilidade de que os filhos criem suas saídas subjetivas e criativas. Da falta nasce a criatividade e a autonomia”.

A busca por apoio
Diante dessa realidade, as famílias estão cada vez mais buscando soluções para aliviar o peso da rotina. A pesquisa mostrou que 87% dos pais acreditam que políticas públicas, como créditos fiscais para custos de cuidado, ajudariam a aliviar a carga. Além disso, 79% dos entrevistados veem com bons olhos benefícios oferecidos por empresas, como subsídios para creches e horários flexíveis de trabalho. Outra demanda frequente é o investimento em tecnologia que facilite a busca por cuidadores de confiança e serviços essenciais para a rotina familiar.
Mesmo com essas possíveis soluções, muitos pais ainda sentem que a responsabilidade recai inteiramente sobre eles, sem uma rede de apoio consistente. A pesquisa mostrou que 73% dos pais acreditam que ter um suporte melhor para os cuidados familiares melhoraria significativamente sua saúde mental e emocional.
“Participar de grupos de pais na escola dos filhos, ou mesmo grupos presenciais e à distância, pode ajudar a enxergar que as dificuldades são compartilhadas e isso alivia o peso dos cuidados”, aconselha a especialista.
O segredo está no equilíbrio
É possível diminuir o ritmo sem comprometer o cuidado e a atenção que você dá ao seu filho. Veja algumas dicas:
- Dê espaço para o tédio: Permita que seu filho descubra maneiras de se entreter sem que você precise planejar cada minuto do dia.
- Evite resolver todos os problemas: É difícil ver os filhos enfrentando desafios, mas isso faz parte do aprendizado e do crescimento.
- Pare de se comparar: Cada família tem sua própria dinâmica. O que funciona para os outros pode não ser ideal para você.
- Encontre prazer na jornada: Foque nas atividades que trazem alegria para você e seu filho, em vez de se preocupar com a perfeição.
Criar filhos é uma jornada cheia de desafios e aprendizados. Ao encontrar um meio-termo entre estar presente e permitir que eles tenham espaço para se desenvolver, você estará ensinando lições valiosas sobre autonomia, resiliência e bem-estar. Afinal, a parentalidade não precisa ser uma missão exaustiva, mas sim um caminho de conexão e crescimento para todos.