O dia 2 de abril marca o Dia Mundial da Conscientização do Autismo, instituído pela ONU em 2007, para ampliar o debate sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA) e os desafios enfrentados por milhões de pessoas em todo o mundo. Mas a conscientização precisa ir além da data: é essencial garantir inclusão, acesso a diagnósticos precoces e suporte para as famílias.
O autismo no Brasil: desafios e números alarmantes
Apesar de o Brasil ser um dos países mais populosos do mundo, ainda não há dados oficiais precisos sobre a população autista. A OMS estima que existam cerca de 2 milhões de pessoas com TEA no país, mas especialistas acreditam que esse número pode ser bem maior. Se aplicarmos a mesma proporção dos EUA (onde 1 em cada 36 crianças é autista), poderíamos ter mais de 6 milhões de pessoas dentro do espectro.
A pesquisa “Retratos do Autismo no Brasil”, realizada pela Genial Care, trouxe dados impactantes sobre os desafios das famílias e das pessoas autistas:
- 64% das famílias não tinham qualquer conhecimento prévio sobre o TEA antes do diagnóstico;
- 79% não se sentem seguras ao pensar no futuro da criança autista;
- 73% enfrentam dificuldades financeiras para custear o tratamento, que pode ser mais caro que tratamentos oncológicos;
- 68% dos cuidadores (majoritariamente mulheres) relatam sobrecarga emocional e falta de tempo para cuidar de si mesmos;
- 49% das pessoas autistas já apresentaram comportamentos de autolesão e o índice de suicídio entre autistas pode ser até 10 vezes maior do que na população geral.
Esses números mostram a urgência de políticas públicas que garantam suporte adequado, desde o diagnóstico até a vida adulta.
Diagnóstico: quanto mais cedo, melhor
O diagnóstico do autismo ainda é um grande desafio. Ele é clínico e baseado em entrevistas com os responsáveis e testes com a criança. Segundo a psiquiatra infantojuvenil Jaqueline Bifano, é essencial observar três principais áreas: dificuldades na comunicação e linguagem, na sociabilidade e padrões repetitivos de comportamento.
“Três linhas de sintomas são importantes para se observar no quadro. Primeiro, o atraso no desenvolvimento da comunicação e linguagem. Em seguida, podemos observar um padrão específico de comportamento que se caracteriza por ser repetitivo, peculiar e restrito, envolvendo desde o manejo do ambiente e situações até objetos. Por último e mais importante, o prejuízo no manejo de situações sociais e no contato com o outro”, explica o psiquiatra da infância e adolescência, Caio Abujadi.
Quanto mais cedo o diagnóstico for feito, mais eficazes são as intervenções. Entre os métodos mais indicados estão a terapia ABA (Análise do Comportamento Aplicada) e o Modelo Denver, que envolvem equipes multidisciplinares com fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais e psicólogos comportamentais.

O impacto emocional e financeiro nas famílias
Além das dificuldades com o diagnóstico e tratamento, o impacto emocional e financeiro nas famílias é profundo. Segundo a pesquisa da Genial Care, 73% dos responsáveis enfrentam dificuldades financeiras para bancar as terapias necessárias, o que compromete a continuidade do tratamento.
Para muitas mães, a sobrecarga é ainda maior. “A informação é a base e o pilar de tudo, e através dela poderemos derrubar preconceitos e visões estereotipadas acerca da síndrome”, ressalta Denise Aragão, membro do Grupo Mundo Azul.
Inclusão escolar e desafios sociais
Apesar de avanços nas leis e políticas públicas, a inclusão ainda é um grande desafio. A Lei 12.764/2012, que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, e a Lei 13.977/2020, que criou a Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (Ciptea), foram marcos importantes. Mas, na prática, muitas crianças ainda enfrentam barreiras na escola e no convívio social.
A desinformação e o preconceito são alguns dos maiores obstáculos. Mais da metade dos participantes da pesquisa do Instituto de Educação e Análise do Comportamento relataram que seus filhos já sofreram preconceito na escola. Ao mesmo tempo, 55% dos pais disseram ter encontrado dificuldades para obter informações seguras na época do diagnóstico.
O papel da sociedade
A conscientização não deve ficar restrita ao mês de abril. Garantir que crianças autistas tenham acesso à educação, saúde e lazer de forma plena é um dever coletivo. Para isso, é fundamental que pais, educadores e profissionais de saúde estejam atentos às necessidades do espectro autista e busquem sempre mais informação.
Afinal, como lembra a psiquiatra Jaqueline Bifano: “Quando diagnosticado o transtorno, o(a) psiquiatra encaminha a criança para o tratamento multidisciplinar, com fonoaudiologia, terapeuta ocupacional e psicologia comportamental. Em conjunto, eles irão aplicar técnicas do tratamento convencional, Denver ou ABA”.
O Dia Mundial da Conscientização do Autismo é um convite para refletirmos e agirmos. A inclusão não é um favor, é um direito. E cada passo dado em direção a uma sociedade mais informada e empática faz toda a diferença.