Perder uma gestação é uma experiência profundamente dolorosa , muitas vezes solitária, e embora o tema ainda seja cercado de silêncio e estigma, é mais comum do que se imagina. Cerca de 80% das perdas gestacionais ocorrem até a 20ª semana de gravidez, segundo dados da Instituição Fecundare.
O que causa a perda gestacional?
Existem diversas explicações possíveis para quando a gestação não segue adiante, e na maioria das vezes, estão completamente fora do controle da mulher. Uma das causas mais comuns envolve alterações cromossômicas no feto. Esses problemas genéticos, que respondem por cerca de 50% dos casos de aborto espontâneo, acabam afetando o desenvolvimento saudável do embrião.
Além disso, há fatores relacionados à estrutura do útero que podem dificultar a continuidade da gravidez. Miomas, pólipos e outras condições podem interferir no desenvolvimento do bebê ao longo das semanas.
O sistema imunológico também pode influenciar esse processo. Em algumas situações, doenças autoimunes levam o corpo a reagir contra a gestação, aumentando o risco de perda. Já no campo hormonal, alterações como a deficiência de progesterona são outro obstáculo, já que esse hormônio é essencial para manter o ambiente uterino adequado durante a gravidez.
As infecções também são fatores relevantes. Infecções graves como toxoplasmose ou rubéola, se contraídos durante a gestação, podem prejudicar o desenvolvimento fetal e resultar em aborto espontâneo.
Por fim, a idade da mulher tem um peso significativo. A partir dos 35 anos, a chance de alterações cromossômicas nos óvulos aumenta, o que também eleva riscos. Ainda assim, é importante lembrar que, mesmo com todos esses fatores, muitas vezes a perda acontece sem que uma causa específica seja identificada, e isso não é culpa de ninguém.
Como lidar com o luto?
A perda gestacional é uma forma de luto legítima e deve ser tratada com respeito e empatia. O ginecologista e obstetra Dr. Vamberto Maia Filho destaca que “não se trata apenas de superar o luto. É um processo de reconstrução emocional e física, em que a mulher precisa ser acolhida com empatia e orientada com responsabilidade”.

O acompanhamento psicológico também entra como um dos pilares nesse momento delicado. Segundo o Dr. Vamberto, “é comum que a mulher sinta culpa, raiva, tristeza profunda ou até medo de engravidar novamente. Um psicólogo especializado pode ajudar a ressignificar a experiência e preparar emocionalmente para um novo ciclo.”
Nesse cenário, vale lembrar que o recomeço não depende apenas da mulher. Companheiros, familiares e amigos fazem parte dessa jornada. Como explica o médico, “é preciso escutar sem julgar, apoiar sem pressionar. Recomeçar depois de uma perda espontânea exige coragem – e toda coragem se fortalece no afeto.”
Cuidados físicos após a perda
O corpo também precisa de tempo para se recuperar. O Dr. Vamberto recomenda uma avaliação ginecológica completa, que pode incluir exames hormonais, de imagem e até testes genéticos, conforme o histórico clínico da paciente. “Essa etapa não serve apenas para entender o que aconteceu, mas para planejar com segurança uma nova tentativa, se for do desejo da mulher”, destaca.
Além disso, a recuperação física envolve cuidados com a alimentação, sono adequado e, quando liberado, a retomada gradual de atividades físicas. Em alguns casos, o uso de suplementos e a correção de deficiências nutricionais podem ser indicados.
Quando tentar novamente?
Embora não exista um tempo exato para retomar os planos de engravidar, o especialista recomenda aguardar pelo menos um ou dois ciclos menstruais completos e, mais do que isso, respeitar o tempo emocional da mulher. “A decisão de tentar de novo deve ser tomada com calma, e com o suporte de uma equipe de saúde comprometida em oferecer acompanhamento físico e emocional integrados”, afirma o médico.
A interrupção natural da gestação é um momento de dor e recomeço. Com o suporte adequado, é possível atravessar esse período desafiador e seguir em frente. E lembre-se: ninguém precisa passar por isso sozinha.