“Sou mãe do Pedro e seria hipocrisia da minha parte dizer que o meu parto não foi o mais importante da minha vida. E também foi o marco zero de uma fase nova, cheia de amor, de alegria, mas também de medos, controvérsias e muitas culpas. Aquelas culpas básicas de mães que trabalham e que não têm como se dedicar 24 horas por dia aos filhos, mas também amam suas carreiras e se sentem culpadas por não poder se dedicar 24 horas por dia ao trabalho.
Talvez o segundo parto mais importante da minha vida tenha sido um que apenas assisti de longe. Eu era uma vestibulanda na época e estava em dúvida sobre que curso prestaria – Direito ou Medicina. Uma amiga, aluna de Medicina, me convidou para acompanhá-la ao hospital da faculdade. Foi pedida autorização ao professor e à gestante, e eu fiquei ali, em um cantinho da sala de parto. Ela sentia as dores das contrações e presenciar aquilo tudo me assustou. Parecia que eu sentia minhas entranhas a cada contração dela. Mas, de repente, o momento mágico aconteceu. Vi aquele bebê saindo, todo melecado, chorando muito, e senti um alívio e uma alegria que só experimentei com tanta intensidade novamente no dia do nascimento do meu próprio filho. Naquele exato momento, tive absoluta certeza de que marcaria o X na opção Medicina para o vestibular e que dedicaria minha carreira à saúde da mulher.
Com o privilégio de ser ginecologista e obstetra, tive a honra de participar ativamente de centenas de partos durante todos esses anos de profissão. E cada um deles me emocionou muito. Você, que já é mãe, lembra daquele momento único, da ansiedade para conhecer o rostinho, sentir o cheiro, tocar a pele do seu bebê pela primeira vez, amamentá-lo com seu próprio leite e também do medo de que algo não saísse como o planejado. E você, que está esperando por esse dia, também sabe do que estou falando.
Agora imagine que o meu trabalho é poder sentir isso todos os dias, há 10 anos. É claro que, infelizmente, nem tudo são flores. É verdade que há também complicações e algumas histórias tristes vivenciadas durante essa trajetória. Mas é verdade também que cada parto e cada gestação tem suas particularidades. Cada ser humano é único.
É óbvio que preciso ser imparcial e manter certo distanciamento emocional da situação para que consiga administrar com a maior segurança possível o pré-natal, o parto e todas as condições de risco que podem se apresentar repentinamente. Mas é impossível não se alegrar infinitamente com o clima de emoção que se cria com o nascimento de um bebê ou se entristecer infinitamente quando algo não sai como o esperado. E é essa emoção que me move a trabalhar, me estimula a estudar, me motiva a acordar de madrugada quando é necessário, tendo que deixar o meu próprio filho.
Quando a culpa bate, seja pelo lado profissional – quando abro mão de uma nova proposta de trabalho para ter mais tempo com ele –, seja pelo pessoal – quando deixo de brincar com ele para trabalhar ou estudar –, penso que tudo o que faço me torna uma mulher feliz e completa. O que mais busco para o Pedro é que ele possa ser feliz também, encontrando seu próprio caminho profissional e pessoal, nunca esquecendo que a família estará sempre aqui, sem frustrações, sem senões”