Minha mãe sempre diz que fui uma criança que vivia em um mundo imaginário, cheio de mistérios e fantasias. E ela tinha razão. Eu adorava criar histórias! A preferida era imaginar que uma bruxa a raptava e a prendia num lugar distante e, enquanto isso, se disfarçava para me enganar. A brincadeira era tentar entrar no ambiente em que estava, pegá-la no flagra e, assim, salvar minha mãe das garras da bruxa malvada. Claro que isso nunca aconteceu! Não me pergunte como o jogo acabava, nem como minha mãe voltava à “vida real” – isso nunca ficou esclarecido!
Apesar de ser paulistana, passei grande parte da minha infância e adolescência em Morungaba, interior de São Paulo, ou pelas dezenas de colônias de férias em que íamos. Sempre tive facilidade em fazer amigos e não me sentia envergonhada em participar de todas as gincanas, apresentações em escolas ou campeonatos para entreter a criançada. E criava peças de teatro, especialmente para as minhas festas de aniversário.
Ir para o interior me aproximou da natureza e, com a família por perto, me sentia segura para desvendar os campos abertos dos sítios por onde passava, nadar em lagos, montar em cavalos e subir em árvores. Tempos felizes, seguros e saudáveis. Não tinha computador, o Atari – videogame da época – era um desejo inatingível.
Minha família sempre foi simples e desatualizada neste sentido. Então, o jeito era criar alternativas lúdicas mesmo.
Se por um lado, o consumismo era algo distante, por outro, foi o que me impulsionou a ser alguém na vida. Meus pais sempre trabalharam muito! Minha mãe, professora de escola estadual, tinha que lecionar de manhã, à tarde e à noite para alcançar o orçamento mensal desejável e ainda arrumava tempo para incentivar os alunos a participarem das inúmeras apresentações artísticas que implantava, e para me levar nas aulas de ballet e ginástica olímpica.
Nunca me esquecerei de quando fui ao programa “É proibido colar” – um game show entre escolas na TV Cultura – com minha mãe e com a o colégio em que dava aula. Na época tinha 8 anos e fiquei maravilhada com o fato de participar daquela orquestra televisiva.
Foram inúmeras as vezes que eu e minha irmã fomos dar aula com minha mãe por não ter com quem ficar. Foi com ela que aprendi a ser comunicativa, extrovertida e me apaixonar pelas artes e pela interpretação. Meu pai, gerente da cooperativa de uma empresa de alumínio, atravessava a cidade até Utinga, em Santo André, diariamente. Acordava cedo, nos deixava no colégio e só nos víamos no fim do dia. Foi com ele que aprendi a ser disciplinada, cumprir meus compromissos e o valor de ser franca, honesta e buscar meus sonhos em ser gente grande e dona da própria história.
No vai e vem dessa rotina quase incessante, brinco que cresci com saudade acumulada, mas a alegria em vê-los no fim do dia e aproveitar as viagens ao interior, eram recompensadoras! Durante muito tempo, jurei para mim mesma que, quando crescesse e me tornasse uma profissional de sucesso, casasse e tivesse filhos, jamais trabalharia. E me enganei!
O exemplo dos meus pais sempre guerreiros, dignos, virtuosos e respeitando os limites financeiros com os pés no chão foram essenciais para que eu me inserisse no mercado de trabalho, buscando ser independente financeiramente logo cedo. Eles sempre tiveram uma psicologia em lidar com as questões delicadas, como sexualidade e drogas, de uma forma bem particular e natural. E também me ensinaram que para fazer jus ao sobrenome e ao gene que carrego, o exemplo é mais forte que a palavra.
Cynthia Benini, mãe de Valentina, é jornalista e atriz. Há cinco anos, apresenta o Jornal do SBT Noite, ao lado de Carlos Nascimento.