Resolvi escrever sobre o verão europeu e, ironicamente, hoje a temperatura caiu. Chove lá fora. As estações do ano aqui na Inglaterra são bem marcadas, mas há também os dias de verão em que fica nublado, faz frio e o dia passa arrastado, acompanhado por uma chuvinha fina e teimosa. Mas é verão, lembra? Então pouco importa se está chovendo! Por aqui a expressão “faça chuva ou faça sol” é coisa séria. “Come rain or shine”, como dizem os ingleses, a vida continua i-gual-zi-nha.
Meu filho chegou dia desses do futebol e resolveu ficar no jardim para continuar o jogo imaginário com seus ídolos. Começou a chover e logo os pingos ficaram grossos a ponto do meu marido descer do home office montado no nosso quarto para saber se estava tudo bem. Estava tudo ótimo! A claraboia, que fica bem no meio da sala, denunciava que realmente a chuva estava forte e deixava passar, além da luz, também a sensação de que chovia dentro de casa. Mas o meu filho não parou. Ele simplesmente vestiu a capa de chuva que tinha levado para o jogo e continuou a partida. Bola para frente. Eu ri sozinha e pensei alto: “Virou um inglês”.
A vida de expatriada traz grandes e pequenas mudanças para a vida. Duas intensidades, porém com a mesma importância. Lembro das crianças recém-chegadas aqui em Londres me perguntando para onde iríamos se estava frio e chovendo. Compreensível, já que em São Paulo era corriqueiro o circuito elevador, carro, escola ou shopping ou restaurante ou casa de amigo. Era final de inverno e elas não tinham ainda experimentado as baixas temperaturas da Europa. É uma parte dura da adaptação a de levar uma vida normal, como se o sol estivesse brilhando, mesmo quando chove, venta e faz um frio de rachar. Depois do sofrimento inicial eu me atrevo até a dizer que o novo hábito virou uma lição de vida. Nada mais nos detém.
Chega a ser engraçado hoje pensar em alguns hábitos e costumes das pessoas e, por que não, das próprias cidades brasileiras e sua relação com a chuva. Sabe aquela marquise onde no Brasil a gente para o carro para alguém desembarcar sem se molhar? Não existe por aqui. Nunca vi proteção alguma a não ser nos pontos de ônibus ou metrô. Ninguém deve nem pensar nessa possibilidade: a de fugir da chuva. Aqui as pessoas têm o hábito de olhar a previsão do tempo e já saem preparadas para o dia. Caso sejam pegas de surpresa, se molham e tudo bem.
Na sapateira que fica na porta de casa moram botas, guarda-chuva e capas de chuva: uma quentinha para o inverno e outra mais fresca para quando não está tão frio assim. Dá um trabalhão vestir as crianças para sair na chuva e no frio, mas eles se acostumam e nós, por fim, também. Para falar bem a verdade, aqui não costuma ir além da garoa. Passamos por poucos temporais e chuvas torrenciais. E se acontece, elas passam rápido. Pelo menos é assim aqui em Londres. Mas quando chega o verão e ficamos um tempo sem tocar na parte “molhada” da sapateira, eles se desacostumam tudo de novo. “Duda, vamos! Bora sair! Você por acaso é feita de açúcar?”. Ela para, me olha confusa e com os olhos encolhidos, como se não conseguisse me enxergar, responde com um “ãh?”. Ai, ai, essas crianças expatriadas. Lá vou eu explicar mais essa expressão para a cabecinha dela multicultural.