Parece coisa de filme futurista, mas é 100% real: médicos brasileiros realizaram uma cirurgia cerebral em um bebê que ainda estava dentro do útero. Para operar, foi preciso retirar o útero temporariamente do corpo da gestante, fazer o procedimento no feto e recolocar tudo no lugar. O procedimento ocorreu em um hospital público do Rio de Janeiro, atendendo exclusivamente pelo SUS.
A cirurgia foi realizada no Instituto Estadual do Cérebro Paulo Niemeyer e acompanhada pela equipe da Maternidade Escola da UFRJ. O caso virou destaque no programa Fantástico, no segundo episódio da série “Trilhas da Mente”, apresentada pelo doutor Drauzio Varella, que está mostrando ao público como o cérebro humano é complexo — e como a ciência está evoluindo para cuidar dele desde os primeiros momentos de vida.
O diagnóstico que mudou tudo
O protagonista dessa história emocionante é o pequeno Nathan, que ainda está no ventre da operadora de caixa Tainá de Andrade. Durante os exames de rotina, Nathan foi diagnosticado com mielomeningocele, uma malformação que ocorre nas primeiras semanas de gestação. Essa condição faz com que a medula espinhal não se feche corretamente, formando uma espécie de bolsa na região inferior das costas do feto.
Esse problema desencadeia outra condição: a síndrome de Chiari tipo 2, em que parte do cerebelo (a região do cérebro que controla equilíbrio e movimentos) desce para dentro do canal vertebral. Isso pode afetar diretamente a mobilidade e até o desenvolvimento cognitivo da criança.
Como funciona a cirurgia intrauterina
Para corrigir essa condição, os médicos fizeram algo que parece saído de um roteiro de ficção científica: abriram o abdômen da mãe, expuseram cuidadosamente o útero e, por meio de um corte de apenas 3,5 cm, acessaram o feto. A equipe de neurocirurgiões reconstruiu as camadas que envolvem a medula — membranas, músculos e pele — fechando a abertura e protegendo a região afetada.
O mais surpreendente é que, ao fechar a medula, o líquido que circula pela coluna volta a se distribuir normalmente. Isso ajuda a reposicionar o cerebelo no lugar certo, reduzindo significativamente os riscos de sequelas.
O impacto direto na vida da criança
De acordo com a neurocirurgiã pediátrica Maria Anna Brandão, a intervenção precoce tem um impacto gigantesco. “Você melhora a parte cognitiva. Melhorando a função motora, você melhora também a autoestima da criança. Quer dizer, você pode tirar ela de uma cadeira de rodas para uma criança que fique em pé”, explicou a médica, ressaltando o potencial transformador dessa cirurgia.
Para os pais e mães que acompanham essas histórias de perto, é impossível não se emocionar. Pensar que a medicina hoje consegue agir antes mesmo do nascimento para mudar todo o futuro de uma criança é algo que nos enche de esperança.
SUS, ciência e cuidado que começam antes do primeiro choro
Além do aspecto técnico e emocionante da cirurgia, esse caso traz outra reflexão poderosa: tudo isso foi realizado dentro do sistema público de saúde brasileiro, e não é apenas uma vitória da medicina, mas também um marco do acesso gratuito a procedimentos de ponta, que muitos acreditam estar disponíveis apenas em países desenvolvidos ou clínicas privadas.
Histórias como a de Nathan mostram o quanto a ciência pode ser generosa e surpreendente. E, para os pais e mães que acompanham o desenvolvimento dos filhos com tanta dedicação e carinho, é um alívio saber que, mesmo diante dos maiores desafios, existem profissionais prontos para lutar por cada vida desde o comecinho.