O Dia Mundial da Saúde, celebrado no dia 7 de abril, traz uma importante reflexão sobre como a medicina deve ir além da cura e focar também na dignidade e bem-estar dos pacientes. No caso das mulheres diagnosticadas com câncer ginecológico, especialmente o de colo de útero, esse olhar é ainda mais necessário.
Segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca), mais de 21 mil brasileiras recebem, a cada ano, o diagnóstico de câncer de colo uterino. Muitas dessas mulheres estão em fase reprodutiva e, além do medo provocado pela doença, enfrentam a insegurança sobre o futuro da maternidade.

Novas abordagens cirúrgicas reduzem impactos à fertilidade
Durante muito tempo, a histerectomia total — retirada completa do útero — foi a principal alternativa de tratamento, mesmo para casos iniciais. Hoje, no entanto, avanços na cirurgia oncológica oferecem novas esperanças para mulheres que ainda desejam engravidar.
Entre as principais inovações estão procedimentos como a traquelectomia radical e a cirurgia robótica minimamente invasiva, que têm se mostrado eficazes em pacientes nos estágios iniciais da doença. “São alternativas que permitem remover o tumor sem retirar totalmente o útero, o que mantém a possibilidade de gestação futura em casos bem selecionados”, destaca o cirurgião oncológico Dr. Marcelo Vieira.
A traquelectomia consiste na remoção do colo do útero e tecidos adjacentes, preservando o restante do órgão. Já a cirurgia robótica permite maior precisão, com incisões menores e recuperação mais rápida, diminuindo os riscos de complicações pós-operatórias.
Planejamento reprodutivo ganha espaço no tratamento
Outra mudança importante é a inclusão do aconselhamento reprodutivo como parte fundamental do cuidado oncológico. A fertilidade deixou de ser uma preocupação secundária e passou a integrar a estratégia terapêutica de forma mais estruturada.
“O planejamento reprodutivo deve estar no centro da estratégia terapêutica quando falamos de mulheres em idade fértil”, afirma Vieira. Ele reforça que a escolha do procedimento deve considerar não apenas os critérios médicos, mas também o desejo da paciente de ser mãe no futuro.
Resultados positivos em casos precoces
Embora a histerectomia ainda seja indicada em quadros avançados, estudos científicos demonstram que abordagens conservadoras apresentam resultados semelhantes em termos de sobrevida, quando aplicadas em estágios iniciais. Publicações nas revistas Gynecologic Oncology e The Lancet Oncology respaldam essa abordagem.
A elegibilidade para cirurgias preservadoras depende de fatores como o estágio do câncer, tipo histológico e desejo de engravidar. Mulheres diagnosticadas com câncer de colo de útero estágio I, sem sinais de disseminação, são candidatas ideais. O tratamento deve ser conduzido por uma equipe multidisciplinar, composta por oncologistas, ginecologistas especializados e profissionais de apoio psicológico.
Igualdade no acesso ainda é desafio no Brasil
Apesar das inovações, o acesso às tecnologias de ponta ainda é desigual. “A maior parte dos procedimentos com tecnologia robótica está concentrada em grandes centros urbanos e na rede privada”, alerta Vieira, que realizou o primeiro transplante robótico intervivos do Brasil em 2019.
Para mudar esse cenário, ele investe na formação de novos cirurgiões por meio de projetos como o Cadáver Lab e o Curso de Metodologia Cirúrgica. “Formar cirurgiões capacitados em técnicas minimamente invasivas é fundamental para que essas mulheres tenham mais chances de preservar sua saúde e sua fertilidade”, destaca o especialista.

Três pilares para avançar no combate ao câncer ginecológico
De acordo com o Dr. Marcelo Vieira, a combinação de três pilares é essencial para transformar a realidade do tratamento oncológico ginecológico no Brasil: ampliar o acesso ao diagnóstico precoce, fortalecer o aconselhamento reprodutivo e disseminar técnicas cirúrgicas modernas.
Essas medidas não apenas aumentam as chances de cura, como também garantem que as pacientes possam retomar suas vidas com mais autonomia e qualidade. Afinal, preservar a fertilidade é, para muitas mulheres, tão importante quanto vencer a doença.