Nas últimas décadas, uma mudança importante vem chamando a atenção de profissionais, famílias e da sociedade como um todo: o aumento no número de diagnósticos de crianças com transtorno do espectro autista (TEA). Nos Estados Unidos, por exemplo, estima-se que uma em cada 31 crianças esteja no espectro. Mas antes de pensar que há uma “epidemia”, é importante entender o que está por trás desses números.
Na verdade, o crescimento de casos tem muito mais a ver com os avanços na forma como o autismo é reconhecido do que com uma explosão real da condição. Mais informação, critérios diagnósticos mais claros e menos preconceito em relação ao diagnóstico explicam boa parte dessa tendência. E tem mais: muitos adultos também estão sendo diagnosticados só agora, após perceberem características.
O que explica o aumento nos diagnósticos?
O aumento nos diagnósticos de autismo está relacionado à maior conscientização e ao aprimoramento das ferramentas de triagem. Profissionais estão mais capacitados para identificar o transtorno, inclusive em meninas, que antes eram subdiagnosticadas. Além disso, com a evolução dos critérios clínicos, crianças que antes recebiam outros diagnósticos, como TDAH ou atraso no desenvolvimento, agora são corretamente diagnosticadas com TEA.
Esse crescimento também reflete o avanço na mobilização de pais e profissionais, garantindo que mais crianças, especialmente de comunidades marginalizadas, sejam diagnosticadas de forma precisa e em fase mais precoce, o que melhora o acesso a intervenções adequadas.
O que é o transtorno do espectro autista?
O TEA é uma condição do neurodesenvolvimento que afeta a forma como a pessoa percebe e interage com o mundo. É chamado de “espectro” porque não existe uma única forma de ser autista. Cada pessoa tem características, desafios e habilidades.
Enquanto algumas crianças conseguem se comunicar verbalmente e viver de forma independente, outras podem precisar de apoio ao longo da vida. Além disso, cerca de 70% das pessoas com autismo apresentam pelo menos uma outra condição associada, como ansiedade, TDAH ou dificuldades sensoriais — e cerca de 40% convivem com duas ou mais dessas condições ao mesmo tempo.
Como o autismo se desenvolve?
O autismo não tem uma causa única. Ele resulta de uma combinação de fatores genéticos e ambientais. Estudos mostram que entre 60% e 90% dos casos têm origem genética, envolvendo diversos genes, ao contrário de condições como a Síndrome de Down, que é associada a um único gene. Isso torna o quadro genético do autismo mais complexo e ainda não completamente compreendido.
Além disso, fatores como idade dos pais, diabetes gestacional, complicações no parto ou exposição a poluentes podem aumentar o risco de autismo — mas não são causas isoladas e não causam o transtorno por si só.

Quais são os sinais do autismo em crianças?
Cada criança com autismo é única, mas alguns sinais costumam chamar a atenção. Entre eles:
- Dificuldades na comunicação (verbal e não verbal)
- Sensibilidade a sons, luzes ou texturas
- Estímulos repetitivos (como balançar o corpo ou repetir frases)
- Preferência por rotinas rígidas
- Foco intenso em assuntos específicos
Mas atenção: o mesmo sinal pode ter significados diferentes dependendo da criança. Por isso, o acompanhamento com profissionais especializados é fundamental.
Como é feito o diagnóstico?
A recomendação é que as crianças passem por triagens de desenvolvimento aos 9, 18 e 30 meses de vida. E sim, é possível identificar sinais precoces já por volta dos 18 meses.
Quanto mais cedo o diagnóstico, maiores são as chances de a criança receber o suporte adequado para se desenvolver em seu próprio ritmo. Embora o diagnóstico geralmente ocorra entre 18 e 24 meses, algumas crianças podem ser diagnosticadas já aos 11 ou 12 meses, caso haja preocupações antecipadas com seu desenvolvimento.
O processo diagnóstico envolve ferramentas como entrevistas com os pais, observações diretas e avaliações padronizadas. Não existe um único teste biológico para o diagnóstico, mas sim uma combinação dessas triagens e avaliações. O “Cronograma de Observação Diagnóstica do Autismo” é considerado o padrão ouro nesse processo.
O diagnóstico precoce é fundamental para o acesso a uma intervenção intensiva precoce, o que pode ser essencial para lidar com os diversos sintomas, especialmente quando a criança não fala.
Mitos e verdades sobre o autismo
Quando o assunto é autismo, ainda circulam muitas informações erradas que podem atrapalhar o diagnóstico e gerar preconceitos. Por isso, é fundamental separar o que é mito do que é fato, com base em evidências científicas.
- Mito: o autismo é causado por vacinas: Essa é uma das fake news mais difundidas — e também uma das mais perigosas. A ideia surgiu de um estudo fraudulento, já desmentido e retirado da comunidade científica. Até hoje, não há nenhuma evidência de que vacinas causem autismo. Pelo contrário: manter o calendário vacinal em dia é essencial para proteger a saúde das crianças.
- Mito: o autismo está “aumentando” por causa do estilo de vida moderno: Muitos associam a alta nos diagnósticos ao uso excessivo de telas ou à alimentação, mas essas relações não têm base científica. O aumento está relacionado a melhor conhecimento sobre o transtorno, ampliação dos critérios diagnósticos e maior acesso à saúde. Ou seja, mais pessoas estão sendo corretamente identificadas.
- Mito: autismo é resultado de problemas na criação ou na relação com os pais: Esse pensamento ultrapassado, conhecido como “teoria da mãe geladeira”, já foi descartado há décadas. Hoje se sabe que o TEA tem origem neurobiológica e multifatorial, com possíveis influências genéticas e ambientais, mas não tem relação com falta de afeto, cuidado ou estilo de criação.
- Verdade: diagnóstico precoce faz toda a diferença: Quanto mais cedo for feito o diagnóstico, melhor o prognóstico para a criança. Isso permite o início rápido de terapias multidisciplinares, que favorecem o desenvolvimento das habilidades sociais, cognitivas e de comunicação. Ficar atento aos sinais desde os primeiros anos de vida é essencial.
Em casos de suspeita…
Antes de tudo, respire fundo. O diagnóstico não muda quem seu filho é. Ele continua sendo a mesma criança cheia de potencial. O que muda é a oportunidade de oferecer o apoio certo, no tempo certo.
Procure orientação profissional e converse com o pediatra. Quanto mais cedo for iniciado o acompanhamento, maiores as chances de construir um caminho de autonomia, inclusão e qualidade de vida.