Os dias nas escolas começam cedo — e terminam tarde. Na minha escola, por exemplo, o expediente inicia às 7h30 da manhã. Da sala onde trabalho, logo na entrada, vejo e escuto o movimento da chegada e da saída das crianças. Acompanho esse ritual há mais de três décadas. Todos os dias.
Em frente à minha sala está a turma do Jardim B, com crianças de cinco e seis anos. Escrevo esse texto numa sexta-feira de manhã, e daqui escuto risadas, vozes animadas e um “bom dia” para quem vem chegando, caloroso que enche a escola de vida. As professoras recebem seus alunos com abraços, beijos e sorrisos. Para as crianças, ficam os carinhos e a segurança de um colo que acolhe; para os pais, o alívio e a confiança de ver seus filhos bem, prontos para viver o dia — mesmo que longe deles.
A sensibilidade que fui cultivando ao longo dos anos me deu experiência. Como convivo com as famílias por um bom tempo — em média, cinco anos, na educação infantil —, consigo perceber nos pequenos detalhes quando alguém não está bem. Uma escola de educação infantil é, ou deveria ser, uma rede de apoio para toda a família. Quem ainda acredita que isso aqui é apenas um “negócio” vai acabar se decepcionando. Escola é afeto. É vínculo. É presença. E, principalmente, é compromisso com a vida de gente pequena, indefesa, em formação.
Uma escola é um organismo vivo, que pulsa. Nunca um dia é igual ao outro. Isso exige dos profissionais uma escuta atenta, abertura ao inesperado e preparo para lidar com as diferenças. Por isso, além do afeto e do acolhimento, é essencial trabalhar o brincar e a arte desde cedo. Além de educadora, sou curadora de arte para a infância. Planejar experiências com a equipe, conduzir oficinas, rodas de histórias, inventar juntos… Isso tudo me nutre. É uma das partes mais bonitas do meu trabalho.

Mas voltando à manhã de hoje, vejo uma professora jogando “Uno” com seus alunos. Escuto as risadas, as conversas, a parceria. E, principalmente, reconheço ali a presença de uma adulta inteira, disponível, com conhecimento, consciente da importância do seu papel. Ela joga junto, ganha, perde, escuta e olha. E é por isso que as crianças a amam tanto. Porque são essas professoras, muitas vezes, que cuidam dos fundamentos da vida: ensinar a esperar, dividir, confiar, pedir desculpas, persistir. Dão continuidade ao trabalho das famílias, que nem sempre podem estar presentes, pois muitas vezes estão envolvidas em suas rotinas de trabalho. Como é importante a escola e a família caminharem juntas, cada uma fazendo sua parte. Educar é tarefa de muitos. E o objetivo deve ser um só: formar essa criança para a vida.
Aprendi, ao longo desses anos, que as crianças não pedem muito: elas pedem presença. E é por isso que o Caracol Escolinha pulsa. Porque aqui há escuta, há tempo, há chão. Porque aqui, a infância não precisa se apressar para virar futuro — ela pode simplesmente ser. Entre jogos, histórias, tintas e afetos, vamos, juntas, formando gente.
Mesmo no Caracol, onde não temos férias de inverno como muitas escolas, sabemos que é preciso respeitar os ritmos e cuidar de quem cuida. Que cada pausa — pequena ou grande — renove nossas forças e nos lembre da beleza que é estar com as crianças.
Boas férias (para quem as tiver) — e bom descanso para todos nós!
Dica sensível de quem vive isso com paixão: o documentário A Arte Através da Infância, dirigido por Gabriela Bordasch, foi exibido durante a exposição A Arte é a Melhor Parte da Infância, que ocorreu no Museu de Arte do Rio Grande do Sul (MARGS) de 19 de abril a 21 de maio de 2017. Tive o prazer de fazer a curadoria dessa exposição, que reuniu obras de 15 artistas gaúchos criadas especialmente para as crianças. O documentário registra esse processo e está disponível no YouTube. Vale assistir.