A Itália anunciou recentemente mudanças significativas nas regras de concessão de cidadania para descendentes de italianos nascidos fora do país. A reforma, que foi aprovada pelo governo italiano em 28 de março, promete afetar especialmente as comunidades de descendentes italianos no Brasil e na Argentina, onde há uma grande quantidade de pedidos de naturalização. A principal mudança está no endurecimento das condições para a obtenção da cidadania por “jus sanguinis” (direito de sangue), que até agora permitia que descendentes de italianos solicitassem o passaporte italiano com base apenas na comprovação de sua ancestralidade, sem restrição de gerações.
O que muda com as novas regras de cidadania italiana?
A partir da implementação das novas regras, apenas filhos ou netos de italianos nascidos na Itália terão o direito automático de solicitar a cidadania. Antes da reforma, qualquer pessoa que conseguisse provar que tinha um ancestral italiano vivo após 17 de março de 1861, data da unificação do Reino da Itália, poderia dar entrada no processo. Isso significava que, em muitos casos, bisnetos ou até tataranetos de italianos poderiam ser elegíveis.
Com a nova legislação, que começou a valer no dia 28 de março, as regras se restringem a uma linha mais próxima de descendência: o requerente deverá ter, no máximo, avós ou pais italianos nascidos na Itália para poder solicitar a cidadania. Como resultado, aqueles que são netos ou filhos de cidadãos italianos, mas não nasceram na Itália, não terão mais direito ao benefício. Essa mudança afetará especialmente aqueles que, em países como o Brasil, haviam conquistado a cidadania italiana anteriormente e agora, com as novas regras, terão sua elegibilidade comprometida.
“Agora, a nacionalidade não pode ser usada como um instrumento para viajar para Miami com um passaporte europeu”, afirmou Antonio Tajani, ministro das Relações Exteriores da Itália, em entrevista coletiva após a aprovação da reforma. A declaração do ministro reflete o objetivo do governo italiano de restringir a “comercialização” do passaporte italiano, que se tornou uma maneira de muitos, principalmente na América do Sul, buscarem a cidadania para obter benefícios de livre circulação dentro da União Europeia.

Alterações no processo de solicitação de cidadania
Além das novas restrições para o direito à cidadania, o governo italiano também anunciou mudanças no processo de solicitação. O segundo projeto de lei prevê que, no futuro, os interessados em obter a cidadania italiana deverão enviar seus pedidos diretamente ao Ministério das Relações Exteriores em Roma, não sendo mais possível fazer a solicitação nos consulados italianos localizados nos países de origem. Essa medida foi criada para aliviar a pressão sobre os consulados, que enfrentam uma grande demanda de pedidos, especialmente na América Latina.
Com isso, os consulados italianos em diversos países, como o Brasil, já anunciaram que suspenderão temporariamente a aceitação de novos pedidos até a regulamentação da mudança. A proposta do governo é centralizar o processo e reduzir as filas que, atualmente, podem levar anos para serem processadas.
“Estamos tentando aliviar os consulados e prefeituras italianas, que lidam com milhares de solicitações anualmente. Hoje, existem mais de 60 mil pedidos em análise”, afirmou Tajani, explicando a necessidade da mudança. A medida visa agilizar o processo e dar mais eficiência ao sistema, que já está sobrecarregado.
Impacto nos descendentes de italianos na América Latina
As novas regras, especialmente a restrição para dois níveis de descendência, terão um impacto direto em muitos brasileiros e argentinos que estão tentando obter a cidadania italiana. Em 2024, por exemplo, o número de solicitações de cidadania italiana na Argentina subiu de 20.000 para 30.000, e no Brasil, o aumento foi de 14.000 para 20.000 pedidos. A Itália estima que, com as novas regras, de 60 a 80 milhões de pessoas em todo o mundo poderiam ser elegíveis para a cidadania italiana, mas o número de pedidos está crescendo a uma taxa exponencial.
“Nos últimos anos, houve um aumento significativo no número de pessoas que buscam a cidadania italiana, e a comercialização dessa oportunidade por empresas especializadas tem contribuído para sobrecarregar os serviços consulares”, explicou o ministro Tajani. A Itália também está combatendo empresas que lucram com a busca por certidões de nascimento de italianos, o que tem gerado um volume excessivo de solicitações nos cartórios municipais italianos.

Reformas no modelo de vínculo com a Itália
Outra proposta que está sendo discutida no Parlamento Italiano visa exigir que os italianos nascidos ou residentes no exterior mantenham vínculos reais com a Itália. De acordo com o novo projeto de lei, todos os cidadãos italianos que vivem fora do país deverão exercitar seus direitos e deveres na Itália a cada 25 anos. A ideia é garantir que os cidadãos que têm a cidadania italiana de fato participem da vida do país, fortalecendo o laço entre os dois mundos.
Essas mudanças fazem parte de um movimento mais amplo para restringir o número de imigrantes e descendentes que podem reivindicar a cidadania italiana, refletindo uma postura mais rígida sobre questões migratórias e de identidade nacional. Enquanto isso, os consulados italianos continuam lidando com a alta demanda e as consequências das novas regras, que já afetam diretamente as pessoas que buscam se conectar com suas raízes italianas.