Quando as férias escolares chegam, junto com elas vem uma enxurrada de posts, dicas, vídeos e promoções tentando convencer os pais de que precisam montar um verdadeiro parque de diversões dentro de casa. Parece que, se não tiver uma programação cheia de atividades mirabolantes, a missão de garantir férias felizes para as crianças vai ser um desastre completo. Mas será que essa correria toda é realmente necessária?
Segundo a psicóloga e hipnoterapeuta Yafit Laniado, criadora da Relacionamentoria — consultoria especializada no relacionamento entre pais e filhos, esse excesso de preocupação pode, na verdade, atrapalhar muito mais do que ajudar. Ela explica que, ao embarcar nessa ideia de que as férias serão um caos, os próprios pais acabam criando um problema que nem existia.
“Na verdade, toda essa propaganda acaba sedimentando a ideia de que ‘lá vem bomba’, e que teremos que enfrentar uma ‘verdadeira batalha’ em casa, com necessidade de ‘munição’ para enfrentá-la. Pois, neste tipo de pensamento é que acabamos tratando as férias como um mal necessário, inevitável e que precisamos suportar pacientemente até o reinício das atividades escolares”, conta Yafit.
E se a expectativa já começa negativa, adivinha o que costuma acontecer? Exatamente o que tememos. A psicóloga alerta que essa ansiedade dos adultos acaba sendo passada para as crianças, que só queriam mesmo ficar de pijama até tarde, brincar com os amigos do prédio e curtir uns dias mais tranquilos.
“Estamos acostumados a pensar que as crianças ficarão entediadas, que é nossa função, enquanto pais, entretê-las e garantir que se divirtam. E enquanto elas estão ansiosas para simplesmente não fazer nada, dormir até tarde, ficar de pijama até a hora do almoço e brincar com os vizinhos no playground, nós transmitimos inconscientemente nosso medo de que a ‘casa vai virar de cabeça para baixo’”, explica. “Finalmente, como num passe de mágica, essa expectativa acaba por se materializar.”

Por que o ócio é importante para as crianças
Segundo a especialista, não precisamos carregar o peso de organizar as “férias perfeitas”. Muito pelo contrário: pode ser libertador deixar de lado essa obrigação de preencher cada minuto das crianças com atividades incríveis.
“Nada de colocar na cabeça obrigações como ‘tenho que garantir que meus filhos não fiquem entediados e que as férias sejam cheias de momentos felizes’, ‘preciso proporcionar passeios e atividades especiais para que eles não fiquem emburrados e tristes’, ou ainda ‘preciso fazer algo especial, para que as crianças se divirtam e não tenham férias horríveis’”, recomenda Yafit.
Essa história de que o tédio é um grande vilão não passa de mito. O ócio também tem seu papel no desenvolvimento infantil, e pode ser o melhor presente para a criatividade. “O tédio, o ócio, a monotonia têm sua função! O sociólogo italiano Domenico De Masi desenvolveu toda uma teoria, escreveu um livro e cunhou o termo ‘ócio criativo’, onde a mente está livre para exercer a criatividade. Nesse sentido, é preciso refletir: quem está entediado, você ou a criança? Quem deve procurar com o que se ocupar, você ou a criança? Quem disse que a criança não precisa lidar com o próprio tédio?”, provoca a psicóloga.
Férias felizes sem complicação
Claro que passeios, viagens, parques, cinema e colônias de férias são incríveis e podem fazer parte da programação de quem tem disponibilidade financeira. Mas não precisam ser regra. Segundo Yafit, o mais importante não é a programação cheia, e sim a forma como os adultos enxergam esse período.
“Evidentemente, colônias de férias, visitas ao zoológico, aquários, parques de diversão, teatro e viagens são ótimas opções para quem pode pagar por esses divertimentos, que convenhamos, não são baratos. Agora, ainda que nada disso possa ser programado, as férias podem e devem sim ser um período muito divertido para toda a família, mesmo sem grandes viagens e passeios. Só depende da nossa perspectiva como pais”, finaliza.
Então, se você estava achando que precisava organizar um cronograma lotado para essas férias, pode respirar aliviado. Às vezes, o melhor programa é justamente não ter nenhum. Afinal, é no ócio que surgem as melhores brincadeiras — aquelas que a gente nem precisa planejar.