Ele: ser pai
Como é difícil para um homem virar um pai. Ele faz filhos, mas como é difícil ser pai. Homem feito pra ser duro, orgulhoso, violento, competitivo, egoísta. Como é difícil para um homem transformar seu coração de pedra em manteiga. É preciso um milagre químico ou intervenção cirúrgica. Ouvir mais e falar menos. Aceitar o imprevisto, o incontrolável. Não ligar para os outros. Tirar suas máscaras, reconhecer o choro. Recolher a âncora, aceitar a onda. Tirar a armadura pra construir um castelo.
Pai não tem útero mas tem colo. Não tem peito, mas tem mamadeira. Não carrega na barriga, mas no abraço. Carrega no ombro, nas costas, na cabeça. Pai engravida no frio da barriga. Gesta no coração. Pare no choro. Nutre no beijo. Alimenta no carinho. Protege na atenção. Pai não nasce pronto. Se quebra no parto, se reconstrói no caminho. Nasce menino, cresce homem, morre pai.
Pai não tem cordão umbilical, mas tem mãos e braços e pernas pra fazer chegar o necessário. Pai não faz leite, mas faz comida. Não amamenta mas faz a papinha, dá a papinha, suja a roupa inteira de papinha, limpa a papinha que caiu no chão. Pai não tem nove meses de gestação, mas tem anos e anos de formação. Gesta fora, tentando acertar. Ser bom pai, bom filho, bom marido, bom homem.
Pai é rei, princesa, professor, Messi, Einstein, Steve Jobs. Gigante, minúsculo, imbatível, chorão. Auréolas invisíveis, asas escondidas embaixo das nossas camisas. Que sejamos os super-heróis que nossos filhos sabem que podemos ser. Heróis comuns, empurrando carrinhos. Agradecidos por um dia termos virado o que nunca imaginamos. Como é bom para um homem virar um pai.
Ela: ser mãe
Era sábado e eu estava grávida de cinco meses quando fui almoçar na casa de uma amiga com um filho de 3 anos. Além de mim, outras duas mães de crianças pequenas dividiam a mesa. Passado algum tempo do almoço, voou do segundo andar uma bandeja de iogurte e espatifou-se na sala. Meia hora depois caiu um vaso, que, ao quebrar, espalhou terra, cacos e folhas por todo o piso. Na hora eu pensei: não quero ser dessa galera, do clube dos “com filhos”.
Era tarde demais. Minha batata estava assando e quando minha filha chegou, logo passei a repetir aquele programa. Felizmente minhas turmas de pequenos meliantes nunca cometeram tais delitos. Mas, aquela sensação de estar só, entre mulheres tentando confraternizar com crianças, me acompanhou inúmeras vezes. Onde estão os homens? O que fazem nos finais de semana tediosos, nas férias, nos finais de tarde infinitos? Por que diabos sobra tudo pra gente?
Ser mãe vai muito além de gestar e parir. A maternidade pode ser muito solitária, geralmente é. A ponto de só nos sentirmos amadas quando temos o segundo filho e aí o primeiro nos faz companhia e nos ajuda. É triste, mas é assim que funciona pra muita gente. Não deveríamos idealizar as mães, colocá-las em pedestais. Mães são apenas mulheres tentando dar o seu melhor para criar as gerações futuras.
São pessoas que equilibram seus dias tentando manter a calma, brincar, trabalhar, não gritar e dar conta de uma lista infinita de coisas. Quando a gente bentifica uma mãe, junto está criando ideais de perfeição, que não fazem nada além de deixar uma mulher sentindo-se insuficiente. Mães não deveriam deixar seus filhos arremessarem objetos, é claro que não. Mas onde estavam os pais dessas crianças? Está aí uma questão que nem passou pela minha cabeça quando julguei – sim – aquele caos.
Moral: “Como é bom pra um homem virar um pai, como é ótimo pra uma mãe quando seu filho tem um pai”
