“Desde pequena via meu pai e mãe preparando meu lanche da escola, ambos saindo para trabalhar, levando-me para a escola e estando juntos comigo à noite. Ao longo da minha vida, a ideia de ter pai e mãe que trabalhavam fora e em casa também, sempre foi algo absolutamente normal. Eu cresci assumindo que homens e mulheres tinham um papel similar na sociedade, no trabalho e em casa, e que a igualdade entre gêneros era a normalidade…”
Inicio esse texto com as palavras de abertura de uma palestra recentemente proferida por minha filha Beatriz fez, na qual compartilhou sua visão sobre igualdade de gênero com um grupo de 200 profissionais no banco onde trabalha. Sua fala fazia parte de suas atividades como uma das fundadoras de um grupo que debate esta questão no banco. Além do infinito orgulho com que li seu discurso, por ter uma filha de 25 anos já engajada e ativa profissionalmente, refleti muito sobre o impacto de nossas próprias vidas sobre nossos filhos.
Mais do que nossas palavras expressando o que pai e mãe pensam sobre igualdade de gênero, é o que fazemos cotidianamente que revela verdadeiramente aquilo que fica registrado e cria seus comportamentos futuros. É óbvio, mas nunca é demais repetir: somos modelos para nossos filhos, seja daqueles traços que nos vangloriamos de ter, seja daqueles que queremos esquecer que possuímos. Filhos são como esponjas, absorvem tudo o que vivenciam dentro de casa. Com o tema da igualdade de gênero não é diferente. Vivenciar pais que se tratam de forma igualitária, que dividem tarefas e despesas, que tomam decisões independentemente de seus gêneros são sinalizadores concretos para que nossos filhos não apenas entendam o conceito de igualdade de gênero. É o que os faz passar a ver tal dinâmica entre homem e mulher como natural, aliás, como sempre deveria ser.
Nós como pais estamos formando as cabeças, atitudes e visão de mundo das novas gerações. Somos responsáveis pelos valores que comporão o caráter deles, a visão que terão sobre o que é “esperado” para o homem e para a mulher. Não podemos nos isentar desse papel se queremos construir uma sociedade que não tenha lentes diferentes para olhar e julgar homens ou mulheres.
Aliás, estudos científicos conduzidos pela pesquisadora de gênero Dra. Christia Brown, autora do livro “Parenting Beyond Pink and Blue: how to raise your kids free of gender stereotypes (em tradução livre: Educando além do rosa e azul: como criar filhos livres de estereótipos de gênero), apontam que os comportamentos e a expressão de sentimentos associados aos meninos e meninas não são fruto de seus DNAs e sim da socialização. Se a casa é o primeiro espaço de socialização, tudo começa no berço, literalmente.
Na vida que construirão, seja no trabalho ou nos relacionamentos, a visão que nossos filhos trarão sobre gênero definirá o que podemos esperar do futuro. Temos a “faca e o queijo na mão” para não só sonharmos com um mundo mais justo para homens e mulheres, como também para permitir que nossos filhos e netos desfrutem de um mundo assim. Quem conhece a expressão “é de pequeno que se torce o pepino”? Tal provérbio vem de uma antiga história que contava que os agricultores que cultivam os pepinos precisam dar a melhor forma a estas plantas.
Retiravam uns “olhinhos” para que os pepinos se desenvolvessem. Se não for feita esta pequena poda, os pepinos não cresciam da melhor maneira porque criavam uma rama sem valor e adquiriam um gosto desagradável. De forma metafórica, tal provérbio reflete bem o que penso. Se queremos que nossos filhos cresçam de forma “correta”, é preciso começar em casa, plantando e semeando a igualdade de gênero que vislumbramos para eles, dando oportunidades iguais em casa, no trabalho, na sociedade.
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