Outro dia, ouvi uma mãe relatando que o filho havia perguntado a ela: “Mãe, por que você olha tanto pro celular?” A mãe me conta isso e completa me contando que estava justamente respondendo a uma mensagem sobre a aula de natação dele e que diante da indagação do menino ficou sem resposta. Porque a verdade é que nossos filhos não vêem o contexto — só vêem o gesto. E esse gesto, repetido mil vezes por dia, vira modelo. Já falei disso aqui e também não é uma novidade: nossos filhos são esponjas do que fazemos, para o bem e para o mal.
A gente fala muito sobre o excesso de telas das crianças, mas será que estamos olhando para o nosso próprio uso? Eu visto muito a carapuça, mesmo tendo filhos adultos, eles me cobram muito pelo uso excessivo que faço do celular. Por sorte, escaparam disso quando crianças pois o digital estava engatinhando à época. Para quem tem filhos, crianças ou adolescentes, nosso comportamento tem consequências, como muitos estudos apontam. Um novo levantamento da YouGov mostra que quase 60% dos brasileiros acreditam que as crianças hoje praticam menos atividades físicas. Só 12% dos pais dizem que seus filhos fazem esportes fora da escola, e 9% afirmam que eles não participam de nenhuma atividade extracurricular. É pouco. E é preocupante. Parte dessa conta, com certeza, podemos computar pelo uso excessivo de telas. E, boa parte, somos responsáveis por essas estatísticas, como pais e modelos, usuários também ferozes de telas que somos.
O sedentarismo infantil não é só uma questão de saúde física — é também sobre desenvolvimento emocional, social e até cognitivo. Criança que não corre, não pula, não se desafia fisicamente, perde oportunidades de aprender sobre limites, frustrações, superações. E quando o corpo para, muita coisa para junto.

Mas será que essa mudança é só culpa da tecnologia? Ou também da forma como nós, adultos, a usamos?
O futurista Roger Spitz criou o termo tecexistencialismo para falar sobre as implicações existenciais da tecnologia. Ele propõe que a tecnologia não é neutra: ela molda nossa forma de viver, de nos relacionar, de existir. E se molda a nossa, molda também a dos nossos filhos — especialmente quando somos o principal espelho deles. Acabo de ler no Estadão de domingo (19/10/2025) uma entrevista bastante interessante com Spitz.
Não é sobre demonizar a tecnologia. Ela está aí, faz parte da vida, e tem seu valor. Mas é sobre perceber que nossos hábitos constroem os deles. Se vivemos sentados, eles também vão se sentar. Se vivemos conectados, eles também vão se conectar. E se queremos que eles se mexam, se desconectem, se interessem pelo mundo real, talvez o primeiro passo seja nosso.
O tecexistencialismo nos convida a refletir: que tipo de existência estamos construindo com nossos cliques, nossos swipes, nossos silêncios digitais? Que tipo de infância estamos modelando quando trocamos o parque pela tela, o olho no olho pela notificação?
Não é justo jogar tudo nas costas da geração que está crescendo. Eles estão aprendendo com o que veem — e o que veem somos nós. Então, que tal começar com pequenos gestos? Um passeio no parque, um jantar sem celular, uma conversa olho no olho. Porque no fim, educar é menos sobre o que dizemos e mais sobre o que fazemos.









