**Texto por Janaína de Azevedo Corenza, mãe de Lavínia. Doutora e Mestre em Educação. Professora das disciplinas pedagógicas dos Cursos de Culturas Africanas e Afro-Brasileiras do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do RJ. Autora e organizadora do livro “Práticas curriculares antirracistas – Temas em construção”, publicado pela Wak Editora
Muitas vezes creditamos à escola o papel na formação dos filhos a respeito de diversos assuntos que permeiam nossa sociedade. O racismo é um desses. Mas será que somente cabe a escola esta conversa? Penso que não. Como professora e mãe entendo que a questão racial deve fazer parte também das conversas familiares.
Nossos filhos encontram nos diversos espaços que participam como igreja, parques, clubes, escola, pracinhas, casa de parentes e amigos, a diversidade de pessoas que forma nossa sociedade. As diferenças de gênero, classe e cor permeiam as relações sociais nas quais nossos filhos fazem parte. Dentro de casa podemos mostrar que as diferenças entre as pessoas é algo positivo, e podemos ir mais além, como por exemplo aproveitar o momentos de família para também possibilitar o diálogo sobre o racismo.
Trago duas reflexões sobre o racismo que os pais podem fazer para si mesmos para depois possibilitar as conversas com os filhos.
A primeira reflexão é sobre os pais acreditarem que o racismo existe e que todos têm um papel importante nesta discussão. Durante décadas a história do Brasil invisibilizou o racismo, tratando episódios racistas como meras brincadeiras ou como fatos sem muita relevância. Nos últimos anos temos mais acesso a diversos fatos que revelam o racismo como o xingamento, a proibição da entrada em espaços elitizados, o mau atendimento em espaços públicos, as denúncias de perseguição em mercados ou lojas ou acusações falsas de assaltos e/ou roubos. Estes e muitos outros exemplos revelam o racismo explícito, sem falar na negação de vagas de emprego ou nas oportunidades de melhoria em cargos de destaque em empresas para pessoas negras. Estes últimos são exemplos de casos implícitos, ou seja, acontecem, mas dificilmente são questionados como racismo.
A segunda reflexão que os pais podem fazer é o entendimento que a luta antirracista é de todos os brasileiros. Lutar contra o racismo não é prerrogativa das pessoas negras. Para uma mudança de cenário é necessário que as pessoas brancas também discutam e promovam ações sobre a temática. Se os dados de pesquisas mostram que os espaços de destaque na sociedade, em sua maioria, estão nas mãos de pessoas brancas, são elas que também têm a responsabilidade na contribuição de propostas de mudanças sociais, reconhecendo seus privilégios e defendendo políticas públicas, fruto de conquistas do Movimento Negro.
Feitas estas duas reflexões, e chegada a conclusão da existência do racismo no Brasil e da relevância do comprometimento de todos com a luta antirracista, reforço a importância de conversar com os filhos sobre racismo e junto com eles construir um pensamento antirracista.
Mas como fazer isso? Trago algumas possibilidades, como por exemplo, assistir filmes que tratam do tema racial seguido de uma conversa sobre os fatos ocorridos. Exaltar as belezas e riquezas africanas e afrobrasileiras como as vestimentas, os cabelos, os traços físicos ou ainda conhecer e apresentar histórias de grandes reinos africanos, saindo do senso comum que limita a África ao período da escravidão. Pesquisar dados atuais de países africanos de língua portuguesa que têm realidades muito próximas do Brasil. Conversar sobre a existência de diversas religiões de matrizes africanas e que todas devem ser respeitadas. Ler ou apresentar livros de literatura onde personagens negros e negras são protagonistas ou também comprar brinquedos e roupas que tragam a representatividade negra de forma positiva como bonecas ou blusas com estampas de figuras que fazem parte das culturas negras. Apresentar dados de pesquisa que mostram a disparidade econômica e social como o acesso à saúde e a educação entre pessoas negras e brancas, enfatizando que o racismo promove tais diferenças no Brasil. Por fim, também trago como um caminho privilegiar desenhos animados ou filmes que despertem nos nossos filhos o reconhecimento do potencial de personagens negros e negras nos enredos das histórias.
Todas as propostas podem ser desenvolvidas nas escolas, mas nada impede que o nosso ambiente familiar também possa explorar, questionar, discutir e contribuir com a luta antirracista, que é diária e que pode provocar mudanças.