Prestes a completar um mês sem o convívio com os filhos, os tatuadores brasileiros Carol Archangelo e Carlos Orleans, residentes em Viseu, no Centro de Portugal, deram uma entrevista reveladora ao Portugal Giro. O casal, que teve a guarda das crianças retirada pelas autoridades portuguesas, denunciou o que considera abusos institucionais cometidos pelas Comissões de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ), em um caso que rapidamente ganhou visibilidade internacional e mobilizou milhares de pessoas nas redes sociais.
Segundo os pais, o processo começou de forma silenciosa e sem o devido esclarecimento. “Se eu comentar, eu não assinei. Eu me sinto enganado pelo Estado”, afirmou Carlos. A esposa, Carol, reforçou a indignação: “Eles mentem para você”.
A história teve início com uma suposta denúncia na escola dos filhos, relacionada a questões comportamentais e de higiene. Depois disso, uma acusação de violência doméstica — já retirada por Carol — foi usada como justificativa para reforçar a intervenção das autoridades, mesmo sem processo judicial ou provas materiais. “Ela me acusou, mas não tem exame de corpo de delito, minha defesa, nada”, disse Carlos. “Foi retirado na mesma semana.”
O casal afirma que nunca imaginou que a retirada da guarda poderia ocorrer, já que até o momento da separação, a situação familiar parecia estável. “Estava tudo normal, mas eles trabalham no escuro”, declarou o pai. Carol acrescentou que foi surpreendida com a rapidez das decisões: “Deveriam ter verificado se há outros parentes e marcado reunião de emergência. Pularam umas cinco etapas”.
De acordo com Carlos, muitos brasileiros vivem situações parecidas em Portugal, mas não têm coragem de falar por medo de represálias. “É para coagir os emigrantes brasileiros, que ficam com medo e vão embora. Acham que somos invasores.” Ele relata que desde que começou a publicar sobre o caso nas redes sociais, recebeu milhares de mensagens com histórias semelhantes. Seu perfil já soma quase 9,5 milhões de visualizações.
Os pais também questionam a alimentação fornecida às crianças desde a separação. Segundo eles, a justificativa para a retirada incluía observações sobre os lanches levados à escola e higiene pessoal. “Agora, comem caixa de peixe industrializado”, relatou Carlos. Carol completou: “E fast food (…) Eu acho que foi mais perseguição”.
A indignação aumenta quando comentam a maneira como foram julgados pela aparência e estilo de vida. “Tenho tatuagem na cara e para eles somos maconheiros”, declarou Carlos, se referindo ao preconceito sofrido. “Tentam diminuir nosso caráter e imagem, como se não honrássemos nossas contas.”
Durante a entrevista, o casal relembrou o impacto emocional da separação. “Mas é horrível chegar em casa sem eles, a ausência no fim da semana”, desabafou Carol. Carlos contou que, diante da dor, recorreu à fé: “A gente recorreu a Deus, porque não usamos nada. Não bebemos, não podemos ficar bêbados porque ganhamos com motricidade.”
Outro momento delicado citado por Carlos foi uma situação mal interpretada em relação aos cuidados íntimos com o filho. “Pedi que não desse banho. Eu faço uma manobra peniana por causa do prepúcio. Eles disseram: ‘Se fosse para pensar assim, eu também seria um agressor sexual’.”
Quando perguntados sobre a possibilidade de retornar ao Brasil, Carlos afirmou que não cogitam a ideia. “Não há interesse de voltar, porque o poder de compra e a segurança são os melhores. Infelizmente, aconteceu isso e as pessoas, como nós, não sabiam. Mas não vamos ficar calados.”
O casal agora luta para que a guarda das crianças seja transferida a familiares. “Não tenho objeção para que passem a guarda. Se não passarem, há má intenção com as crianças”, afirmou o pai. Ele também critica o suposto interesse que as instituições demonstram por crianças “bonitas e educadas”.
A repercussão do caso levou à criação de uma petição endereçada ao presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, pedindo maior fiscalização das ações da CPCJ. No entanto, os órgãos envolvidos — como a Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens (CNPDPCJ), o Ministério Público e a escola — foram procurados, mas não deram retorno até o momento da publicação.
Em resposta ao Portugal Giro, a CPCJ de São Pedro do Sul declarou que os processos em questão já haviam sido remetidos ao Ministério Público devido à falta de consentimento dos pais para a intervenção. O MP, por sua vez, ainda não se pronunciou.
Diante da dor e da indignação, Carlos finaliza: “O principal requisito é silêncio, não pode postar nada e tem que ficar calado diante de um abuso, sem os seus filhos.” Para ele e Carol, a luta agora é não apenas pela recuperação da guarda, mas também para que outros pais não passem pela mesma experiência.