Nos emocionamos com esta história. Uma mulher de 19 anos se tornou mãe e órfã no mesmo dia. Isso mesmo! Em entrevista ao site HuffPost Brasil à jornalista Isabel Marchezan, Tamires de Souza, de 30 anos, contou que não teve tempo de sentir luto, porque quando sua mae morreu, em 2007, ela se viu na situação de mãe dos três irmãos menores. Veja trechos da história publicada no HuffPost Brasil:
Em 7 de maio de 2007, Tamires Oliveira de Souza ligou para sua casa após o expediente, como de costume. Enquanto batia um papo pelo telefone com a mãe, Márcia, algo aconteceu. A ligação caiu. Tamires rediscou o número de casa, e quem atendeu foi a irmã mais nova. “A mãe caiu”, disse Jéssica, com 8 anos na época. “Parem de brincadeira, deixa eu falar com ela”, desconversou Tamires, acostumada com as brincadeiras de Márcia. “Mana, eu acho que é de verdade”, respondeu Jéssica. “Corre e chama a Bete!”, ordenou Tamires, e a irmã mais nova foi pedir socorro à vizinha.
A ambulância veio, mas as tentativas de reanimar Márcia, hipertensa, portadora de doenças cardíacas, não tiveram sucesso. Ela morreu aos 42 anos, deixando seis filhos de dois casamentos. Tamires era a segunda mais velha, e imediatamente assumiu a guarda dos menores – de dois, quatro e oito anos.
“Nunca me passou pela cabeça deixar eles com o pai biológico. No velório mesmo eu já o informei que ia ficar com as crianças”, conta Tamires. O pai dos três pequenos já estava separado de Márcia e não se dava bem com os mais velhos (além de Tamires, um menino de 17 e uma moça de 21). A primeira providência da ainda adolescente foi sair da casa da família, em Viamão, cidade vizinha de Porto Alegre. Não suportava a ideia de permanecer no ambiente em que sua mãe morreu. Se mudou dali com as três crianças – Leonardo, o caçula, Lucas e Jéssica, a mais velha – para a capital. Morou de aluguel em três endereços diferentes, chegou a trabalhar fora o dia todo, deixava os dois meninos com uma babá e na creche. Jéssica ia para a escola de manhã e ficava à tarde sozinha no apartamento.
“Eu chegava em casa e tinha de deixar tudo pronto para o dia seguinte. Ia dormir de madrugada. No final de semana, pegava ônibus com os três para ir ao parque, ao shopping. Onde eu ia, eles iam”. Inclusive ao cemitério. “Eu ia levar flores, e tinha de levar eles junto, fazer o quê? Aí eu explicava que o corpo da mamãe estava morando ali, mas ela estava em outro lugar, no céu. Ainda rezo todo dia, mas parei de ir lá”. Nesta época, Tamires foi trabalhar como secretária em consultório médico, ofício que desempenha até hoje.
Naquele tempo, a avó paterna das crianças apoiava bastante os netos, financeira e afetuosamente. Tamires fazia questão que convivessem com tias e primos, mas a atenção do pai eles não tinham, e isso para ela foi mais difícil do que qualquer dificuldade financeira. Um ano após a morte de Márcia, ela recebeu uma notificação da Justiça: o ex-padrasto reivindicava a guarda dos filhos. “Aí foi que eu comecei a sofrer. Tinha 20 anos, não entendia nada de leis, me desesperei. Achei que não tinha condições de ir contra o pai deles”. Tamires procurou uma advogada, juntou notas fiscais e documentos de colégio, remédios, médicos e, na audiência judicial, conseguiu provar à juíza que vinha proporcionando uma vida confortável aos três – que o pai, por outro lado, não conseguiu mostrar que manteria.
“Ali, a juíza encerrou a questão e manteve a guarda comigo”, conta. Desde então, a família perdeu o contato. Seis anos depois, cansada de ter de correr atrás da contribuição informal de R$ 200 dele todo mês, Tamires decidiu processar judicialmente o pai das crianças para que cumpra com suas obrigações. O processo ainda corre e, segundo Tamires, ele está com a prisão decretada.
Casada desde 2009 com Luís Fernando, Tamires voltou para Viamão. Hoje mora na casa que era da mãe com o marido e as três crianças. O casal havia, inclusive, decidido não ter filhos. “Já tínhamos uma vida de pai, mãe. E ainda um monte de sobrinhos”. Mas, quando a vida parecia estabilizada de novo, veio outra surpresa.
Tamires tinha trocado de pílula anticoncepcional, por orientação médica, mas não se adaptou e, com apenas horas de atraso na menstruação, já sabia que algo estava acontecendo. Fez um teste de farmácia e, por dois dias, “só chorava”. Contou a novidade para os irmãos antes de criar coragem de dizer a Luís Fernando, que seria pai.
Hoje Bernardo tem um ano e três meses e olhos amendoados muito brilhantes. Tamires chegou a deixar o emprego no consultório médico para cuidar dele, mas foi chamada de volta e hoje trabalha meio turno – Jéssica assumiu as manhãs. Os dois tios ajudam a cuidar do pequeno, assim como da casa: louça, roupa, faxina, todas as tarefas são compartilhadas com os três homens no lar simples de quatro cômodos e um banheiro. “Meu marido faz tudo. Eu não lavo uma cueca dele”.
Na estante da sala, um porta-retrato com “MAMÃE”, em letras garrafais entalhadas mostra uma fotografia com seis pessoas: Tamires, o marido e seus quatro “filhos”.
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