**Texto por Márcio Chagas, professor de Educação Física, ex-árbitro de futebol, pai de Miguel e Joana
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Estávamos assistindo um programa de televisão, quando de repente meu filho pergunta:
– Papai, por que tu não choras? Eu nunca te vi chorando.
Fiquei sem palavras e sem respostas para tentar explicar o motivo ou não motivo , e calei. Tão cedo meu filho percebeu a dureza do que é ser um homem negro que é ensinado a não demonstrar sentimentos para conseguir sobreviver a um sistema opressor que condena quem ousa chorar e se colocar em vulnerabilidade.
Passei toda minha infância ouvindo que homem não chora, de quem chora é bichinha, putinho ou maricas. Esse tipo de frase não era dita somente por eu ser negro, mas era um agravante por eu ainda ser negro.
– Além de negro é chorão!
Por dias fiquei com essa pergunta do Miguel na minha cabeça, tentando entender o porque dele ter me perguntado aquilo. Lembrei do dia que denunciei o caso de Bento Gonçalves, foi um dos mais pesados da minha vida. Fui tomado de emoções, lembranças e sentimentos que até então não podia expressar naquele ambiente machista que é o futebol.
Ter me emocionado em pensar que não gostaria que meu filho tivesse que vivenciar tudo aquilo, foi motivo para muitos comentários tentando me menosprezar como mimizento e vitimista, como se eu não pudesse expressar meus sentimentos e chorar.
Aos homens negros há uma cobrança muito grande de demonstração de virilidade e macheza, além da hipersexualização e o fetiche do proibido.
– Será que é tudo isso mesmo?
Não somos vistos como sujeitos, mas sim como objetos estereotipados para o imaginário da brutalização. Ainda com o questionamento do meu filho, fico lembrando da última vez em que me permiti chorar, e faz tempo, foi quando perdi minha irmã há quase 20 anos.
São tantas provações diárias , que o amargo da vida toma conta como proteção para não demonstrar que podemos fraquejar e alguma lágrima ousar cair dos nossos olhos.
– Tenho que ser forte!
– Homens não choram!
Sabe Miguel, eu quero que tu chores e expresse todos os sentimentos para não sentir o vazio da tristeza por ter sido reprimido por uma sociedade que nos impõem a vida toda o que podemos ser ou fazer. Queria que tu estivesse aqui comigo para ver o pai chorando, te abraçando e te beijando, mas ainda tenho o receio de que minhas lágrimas sejam julgadas.