Uma vez me perguntaram qual era a minha tribo? Ainda adolescente, época em que nos aproximamos dos nossos “iguais” e andamos em turminhas, eu não conseguia dizer qual era a minha galera. Eu fazia parte do grupo fundão na sala de aula, mas era estudiosa e tirava as maiores notas. Tinha amizade com os populares, mas também saía pra passear com os considerados “nerds”. Fazia ballet e jogava taco com os meninos da minha rua. Nunca gostei que me colocassem em caixinhas. Talvez por isso quando minhas amigas tiveram seus filhos, eu me incomodei tanto. Não por ainda não ter engravidado, mas porque a nossa turma de solteiras e recém-casadas se dividiu. Pela primeira vez na vida, me senti pertencente ao grupo das “sem filho”.

Toda festinha ou evento era a mesma coisa: as “sem filho” de um lado e as “com filho” do outro. Nossas conversas não passavam dos cumprimentos iniciais. Eram sempre interrompidas por um — “Ai, desculpa… Tenho que ver o Juninho” — pra nunca mais voltar… Aquilo me irritava tanto! Me sentia mal, excluída. Como se eu não pudesse conversar sobre gravidez, filhos e outras coisas da maternidade. E olha que eu me empenhava! Curiosa que sou, perguntava sobre tudo na tentativa de não receber a porta na cara. Eu sempre tive vontade de ser mãe e aqueles assuntos realmente me interessavam. Mas como ainda não tinha filhos, não tinha o passe-livre para aqueles diálogos. Me contentava em me juntar ao grupo dos homens e as poucas amigas solteiras para conversar sobre futebol, viagem e rock’n’roll enquanto bebia meu vinho branco preferido e observava as amigas-mães correndo atrás de suas crias.
Esse texto não é uma crítica, é um “paguei a língua”. Depois que me tornei mãe é que pude entender por completo a tal divisão entre as mulheres no quesito “maternidade”. E não está diretamente relacionado aos filhos, é algo mais íntimo e profundo. Tem a ver com medo, constrangimento, insegurança e uma pitada de invejinha branca. Se é que isso existe!
Enquanto meu eu de antes sentia-se excluído de uma turma que havia realizado o sonho de ser mãe antes dos trinta, que organizava passeios sub-2 nos fins de semana e que se reunia para comemorar o mesversário dos pimpolhos, o meu eu de hoje também se frustra por não conseguir sair pra tomar um vinho branco depois das seis da tarde com os amigos, se constrange de convidar os solteiros pras festinhas “boring” regada a biscoito de polvilho e chá mate e, principalmente, se irrita de não poder ter uma conversa completa, em paz, até o fim, sem pressa, sem ser interrompida por uma fralda vazada de cocô mesmo que o assunto seja sobre filhos, os maiores tesouros que temos na vida.
Só agora entendo o real significado da palavra sororidade que pra mim não está mais relacionada a solidariedade entre as mulheres do que ao feminismo. O slogan “juntas somos mais fortes” ganha ainda mais significado nesse contexto. Com filhos ou sem filhos, somos todas iguais e devemos nos olhar com mais empatia porque só mesmo sendo mulher para entender as dores de ter de representar papéis ou entrar em caixinhas estabelecidas pela sociedade.